Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri

Confesso que invejei a juventude que se levanta pela democracia

Ir às ruas em defesa da democracia seria obrigação não fosse a pandemia

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“Na última sexta-feira, em um país, uma morte por minuto! Terrível!”, disse o papa Francisco, durante a cerimônia do ângelus, na praça de São Pedro, no Vaticano.

Referia-se ao Brasil, sem precisar nominar.

“Sejam cuidadosos. Não cantem vitória cedo demais”, prosseguiu, para arrematar: “Ainda temos que seguir as regras”.

Francisco desempenha para o mundo o papel que Dom Paulo Evaristo Arns exerceu por décadas no Brasil, mais especialmente em São Paulo. Até os ateus admitem.

Sem medo do vírus ou dos tiros, ou apesar dele, milhares de pessoas foram às ruas pelo país afora clamar por democracia e por respeito às vidas negras.

Treinado nas passeatas dos anos 1960, na clandestinidade da década de 1970, e nas manifestações pelas Diretas Já!, nos 1980, deu vontade de estar junto. Muita!

A quarentena imposta não só aos dos grupos de risco, o receio de contaminar e de ser contaminado, impôs a prudência, apesar da impaciência.

Teria sido irresponsável incentivar as pessoas a participar, péssima atitude de pedir valentia com o pescoço alheio.

E foi inútil pedir aos mais jovens que não fossem, dois de quatro filhos presentes.

Os tempos são outros.

Em 1967/68, íamos às avenidas sabendo que haveria confronto porque as tropas estavam a serviço da ditadura.

Provavelmente a rara leitora e o raro leitor não estariam lendo estas linhas não fosse um tal Régis, cujo sobrenome desconheço, brasileiro grande e claro como um viking, que evitou a fratura de minha pobre cabeça.

Corria da cavalaria na praça da República, depois de jogar bolinhas de gude no asfalto, quando senti um puxão por trás no colarinho. “Pronto, estou preso”, pensei. Nada!

Concomitantemente com o puxão, um cassetete, empunhado por cavalariano, passou rente aos meus olhos. Aquilo, no crânio, faria belo estrago.

Hoje trata-se de impedir novo surto autoritário, mas com a pandemia assassina no ar e o governo federal a dela desdenhar, além de buscar ocultá-la em sua prática genocida.

O Brasil é país sui generis. Relaxa o isolamento social enquanto está a caminho do ápice da curva —e vive o “presidencialismo sem presidente”, como bem sacou o governador maranhense Flávio Dino.

Apesar de tudo, e por causa de tudo, que vontade de estar no Largo da Batata!

Já não vivo para me arrepender por ter cumprido promessa e não ter ido ao Maracanã na invasão corintiana, em 1976.

Ou, por preguiça de tanto tempo de voo, deixado de viajar ao Japão em 2012 para o bicampeonato mundial de clubes Fifa.

Felizmente estava no Morumbi, em 1977, com Basílio; no palanque das Diretas, em 1984, com Osmar Santos; no Rose Bowl, em 1994, com Taffarel; no Maracanã, em 2000, no primeiro Mundial de Clubes Fifa, com Dida e no Pacaembu, em 2012, com Emerson Sheik pela Libertadores.

Há muito jogo pela frente, o campeonato pela garantia das liberdades está apenas começando e será necessária organização impecável, responsabilidade e coragem para estarmos todos juntos no dia da vitória.

Lembro do Doutor Sócrates ao chegar ao Corinthians, em 1979. Ele apelava para a Fiel não apressar o time para vencer nos primeiros minutos porque, em regra, os jogadores iam para o ataque sem cuidado e eram derrotados.

“Nosso gol vai sair naturalmente, passe a passe”, dizia.

Duvidei de que fosse ouvido. Pois foi.

E foi campeão paulista em 1979, 1982 e 1983.

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