Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Pau que nasce torto morre torto, inclusive entre atletas

São inúmeros os casos dos que tiveram novas chances e sucumbiram à natureza

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Waldeck Artur de Macedo, o Gordurinha (1922-1969), foi um compositor, humorista e radialista nascido em Salvador, que fez sucesso com “Baiano burro nasce morto”, complemento do refrão “O pau que nasce torto, não tem jeito, morre torto”.

Os humanos são como os paus. Ou como os escorpiões. Desnecessário contar de novo a fábula do escorpião e a tartaruga, não?

Não!

Resuma-se: o escorpião queria atravessar o rio, não sabia nadar e pediu carona à tartaruga que, de cara, recusou, temerosa de ser atraiçoada e levar uma picada. Mas acabou convencida pela argumentação do escorpião. Afinal, disse ele, se a picasse também morreria. A tartaruga cedeu e no meio da travessia levou a picada. Incrédula, ouviu do animal: “É a minha índole. Eu não consigo me controlar, eu nasci assim”.

São inúmeros os casos de atletas que tiveram segunda, terceira, quarta chances e sucumbiram à natureza.

E aqui não se contabilizam casos de doenças, dependências químicas, por exemplo, porque aí estaríamos falando de azares do DNA. Trata-se da questão dos temperamentos.

Assim como o pensador inglês Samuel Johnson (1709-1784) disse que o segundo casamento é a vitória da esperança sobre a experiência, é da condição humana dar novas chances a quem errou, atitude generosa em regra ou meramente interesseira.

Às vezes até dá certo, como deu com Dunga, injustamente rotulado como símbolo do fracasso na Copa do Mundo de 1990, na Itália, e devidamente reabilitado na Copa seguinte, nos Estados Unidos, a do tetracampeonato.

Verdade que, fruto de seu gênio briguento, Dunga acabou por entrar para a história como único capitão que ao receber a taça xingou os circunstantes, os fotógrafos que representavam a imprensa, antes de erguê-la.

O mais frequente é as novas chances terminarem mal, porque os traços de personalidade se impõem.
Felipe Melo será sempre um pavio curto prestes a explodir e suas escolhas fora das quatro linhas demonstram cabalmente a preferência pela truculência.

Felipe Melo, com camisa do Palmeiras, máscara de proteção e bolsa laranja pendurada no ombro, ergue o polegar para a câmera
Felipe Melo durante avaliação física no Palmeiras - Cesar Greco/Palmeiras/Divulgação

O bom zagueiro Júnior Baiano, que de burro nada tem e brilhou no Flamengo, no São Paulo e Palmeiras, até titular foi na Copa do Mundo de 1998, na França, não terminava temporada alguma sem aprontar enorme lambança, fosse técnica, fosse disciplinar.

Valdivia, Cueva, Deyverson, Kleber Gladiador, o Animal Edmundo, tantos, independentemente do talento, sempre se caracterizaram por ser bombas-relógios, imprevisíveis sobre o momento da irrupção, mas inevitavelmente explosivas.

Almir, o Pernambuquinho, talvez seja quem melhor tenha resumido tudo isso. Craque de bola, e nas confusões que arrumou pelo mundo afora, acabou assassinado, aos 40 anos, em bar de Copacabana ao, nobre e corajosamente, defender um grupo de dançarinos assediados por três cafajestes.

Por que tais reminiscências agora? —talvez perguntem a rara leitora e o raro leitor.Porque de repente, não mais que de repente, (a benção, poetinha Vinicius de Moraes!), fez-se o silêncio num certo palácio no Distrito Federal e não são poucos os que, por autoengano, ingenuidade, fé desmedida, ou por interesse inconfessável, tenta nos convencer de que o ogro genocida, incompetente, homofóbico, racista, misógino, adorador de torturadores e ditaduras, entrou em modo civilizado.

Quem acreditar nisso, acredita em tudo.

Na Terra plana, principalmente.

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