Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri
Descrição de chapéu Seleção Brasileira

Jogadores do Maracanazo, como Barbosa, não são festejados ao completarem um século

O goleiro negro é o protagonista mais dramático, bode expiatório da derrota dolorosa

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O lateral direito Augusto completaria 100 anos em outubro passado e a data passou em branco.

O zagueiro Danilo também, em dezembro de 2020.

Assim como Jair Rosa Pinto, lembrado, é verdade, aqui e ali no último domingo (21), provavelmente mais pelos caçadores de efemérides em tempos de pandemia.

Neste sábado (27) Barbosa faria 100 anos.

Barbosa em 1958, durante sua segunda passagem pelo Vasco, ano em que conquistou um estadual e o Rio-São Paulo
Barbosa em 1958, durante sua segunda passagem pelo Vasco, ano em que conquistou um estadual e o Rio-São Paulo - CPAD-CRVG/Divulgação

Em setembro que vem será a vez de Zizinho, o Mestre Ziza, ídolo do Rei Pelé, dia 14.

Em 2022, Bigode, Ademir de Menezes, o Queixada e Chico.

Juvenal fica para 2023 e Bauer só em 2025. Entre um e outro, em 2024, Friaça, o autor do solitário gol brasileiro, o do 1 a 0 no fatídico 2 a 1 para o Uruguai.

De todos os brasileiros participantes da final da Copa do Mundo de 1950 no Maracanã com lendários 200 mil torcedores, o goleiro negro Barbosa é o protagonista mais dramático, bode expiatório da derrota dolorosa.

Moacyr Barbosa Nascimento morreu culpado irremediavelmente em 2000, condenado à prisão perpétua como lamentava nos últimos anos de vida.

Não por coincidência, a culpa é até hoje dividida com outro negro, o lateral esquerdo Bigode, acusado de covardia por não ter reagido à suposta bofetada no rosto desferido pelo capitão uruguaio Obdulio Varela, e em cima de quem Gigghia fez o gol da virada.

Barbosa cai e tenta evitar o gol de Ghiggia, o segundo do Uruguai no jogo final da Copa do Mundo de 1950
Barbosa cai e tenta evitar o gol de Ghiggia, o segundo do Uruguai no jogo final da Copa do Mundo de 1950 - Fifa/Divulgação

Obdulio, também negro, negou a agressão até morrer e para sempre é tido como o grande herói daquela Copa, pelos brasileiros inclusive, como se os negros uruguaios valessem mais que os nacionais.

A injustiça com Bigode, no entanto, não produziu restrição aos laterais pretos, diferentemente do que se deu em relação aos goleiros, a ponto de a seleção brasileira só voltar a ter um como titular em 2006, na Alemanha, 56 anos depois do Maracanazo.

Nunca ninguém admitiu o preconceito, nem precisava.

O centenário de Barbosa não é comemorado. No máximo, é lembrado como desagravo, tardio, sem o testemunho dele, cuja entrada na concentração da seleção, em 1993, antes do jogo contra o mesmo Uruguai que definiu a classificação para a Copa nos Estados Unidos, teria sido negada (há quem desminta) para não dar azar.

Tivesse mesmo tomado o tapa, Bigode, caso o Brasil saísse vencedor, seria elogiado pela maturidade, pelo sangue frio, por não ter caído na provocação e desfalcado o time.

Também entre o 2 a 1, marcado aos 34 minutos do segundo tempo, e o fim do jogo, houve tempo suficiente para o empate que significaria o título.

Não importa: a culpa é de Barbosa, pela falha no gol.

No dia 1º de janeiro de 2046, Roberto Rivellino, um dos heróis do tricampeonato em 1970, completará 100 anos e será devidamente festejado.

Apesar de, em 1974, ter sido responsabilizado injustamente pela derrota do Corinthians contra o Palmeiras, na decisão estadual que acabaria com o jejum de 20 anos sem títulos.

Três dias antes, no primeiro jogo das finais, empate em 1 a 1, ele recebeu milhões de elogios por ter jogado para o time, sem um pingo de estrelismo.

Pois repetiu sem tirar nem por a atuação no jogo definitivo, derrota alvinegra por 1 a 0.

O mundo caiu sobre sua cabeça, tronco e membros e, por exigência da torcida, o melhor jogador da história corintiana acabou vendido para o Fluminense.

Melhor prova impossível de que a voz do povo nem sempre é divina.

Melhor prova, não! A melhor segue sendo a da injustiça cometida com Barbosa.

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