Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

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Katia Rubio

A necessidade da integridade

A sociedade, e o esporte como parte dela, precisa de compliance

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Há um considerável número de palavras usadas no meio corporativo para afirmar aquilo que todo cidadão de bem e toda empresa lícita deveria praticar sem esforço: a honestidade.

Os termos não variam muito e seguem o roteiro ditado pelo mundo da moda. Compliance é a bola da vez. Num bom português, isso significa cumprir a lei, obedecer, andar na linha, ter compromisso com a integridade, satisfazer o que é determinado pela lei.

Instituições e pessoas que cumprem seu dever de forma justa e honesta passam a ser tomados, nos dias atuais, como exemplos de compliance. E o que é mais curioso é que fazem exatamente o que deve ser feito, demonstrando como o mundo anda esquisito.

Paulo Wanderley, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, discursa durante congresso em 2019
Paulo Wanderley, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, discursa durante congresso em 2019 - Ana Patrícia/COB

Em tempos em que se é culpado até que se prove inocência, parece mesmo que foi ontem que Cesar afirmou que sobre sua esposa Pompéia não deveria recair nenhuma suspeita. Não há aí nenhum julgamento moral, senão o desejo da certeza de que quem se afirma justo, de fato o é. O dito popular é direto e reto: À mulher de César não basta ser honesta, ela deve parecer honesta.

A honestidade não é coisa fácil. Exige integridade, prática em desuso nos tempos atuais. Promessa tem relação com juramento, que não necessariamente é um ato religioso, mas transmite a ideia de que a palavra dada basta. É o antigo fio de bigode trocado entre homens íntegros quando da realização de um acordo. Não era preciso papel assinado, com firma reconhecida em cartório.

A soma da promessa com a credibilidade produz uma espécie de certeza de que algo será realizado. Essa atitude, comum em época de campanha eleitoral, leva o eleitor a viver a certeza (ou ilusão) de que algo desejado será cumprido. E, assim, são conquistados apoios e votos. Mas, como dizia minha sábia avó, conhecemos com quem convivemos depois de gastar pelo menos um quilo de sal em lar de hipertensos.

Ou seja, o tempo é o melhor auditor para se afirmar compliance. Promessas são postas à prova quando o centro da investigação é exatamente aquele que dispara o processo.

As instituições esportivas nunca primaram pelo princípio da democracia. Nasceram e cresceram dentro de um sistema autocrático, senão despótico. Independentes do poder público (mas não da verba pública), construíram seus sistemas de sucessão e de gestão conforme a conveniência.

Auditar tudo isso é coisa dos últimos 30 anos, depois que a corrupção passou a macular aquilo que de mais precioso havia no Olimpismo: seu sistema de valores. Começou com a compra de votos para a escolha das cidades sedes, quando ainda o amadorismo era um dos pilares do Movimento Olímpico.

Entretanto, os pecados capitais não pararam por aí. Com a profissionalização e a comercialização das competições, o sistema de vantagens ilícitas se multiplicou em efeito cascata, alcançando a macro e a microestrutura do sistema esportivo.

Foram décadas de falta de transparência e enriquecimento ilícito de pessoas associadas a instituições que deveriam se dedicar ao desenvolvimento de um patrimônio cultural da humanidade: o esporte.

A sociedade, e o esporte como parte dela, precisa de compliance. Seria maravilhoso não ser necessário os serviços de uma empresa de auditoria para provar isso. Bastaria que a esposa honesta de César também parecesse ser honesta, afinal credibilidade anda junto com integridade. Os atletas brasileiros estão de parabéns ao optarem por esse caminho, mostrando que sua participação no sistema não se restringe apenas a mostrar suas habilidades motoras. Eles são e sempre serão a razão de ser dos Jogos Olímpicos e do Olimpismo.

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