Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

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Katia Rubio
Descrição de chapéu Coronavírus tênis

O negacionismo que invade as quadras de tênis

Atitude de Djokovic e outros tenistas fez parecer que eles vieram de outro planeta

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Tenho muitas dúvidas sobre a diferença que existe entre a falsa ignorância e a burrice premeditada. Claro está que essa minha dificuldade em compreender o que diferencia uma da outra se relaciona com esse louco mundo contemporâneo.

Em tempos em que a popularidade é medida por curtidas em redes sociais, ainda que estas sejam promovidas por robôs, observo atitudes polêmicas com desconfiança. É mesmo difícil de acreditar que um ser humano que circula pelo mundo nestes tempos atuais negue o perigo que ronda os cinco continentes.

Uma das provas dessa minha tese reside no torneio “Adria Tour”, promovido por ninguém menos que o número 1 do ranking mundial do tênis, Novak Djokovic. Tratou-se de um torneio de exibição, ou seja, “sem fins lucrativos”, entre aspas é claro, porque sempre que os primeiros do ranking se reúnem para alguma coisa alguém está lucrando. Se não com dinheiro vivo, certamente sobre a imagem de alguém.

Ou seja, assim como outros tantos atletas mundo afora, os convidados dessa competição certamente estavam sedentos por suar a camisa, sujar o tênis e ouvir com regozijo aplausos, apupos e, por que não, os sons emitidos pelo juiz. Afinal, esporte é isso. Competição com público e emoção.

O que se viu, porém, foi um profundo desrespeito a todos os protocolos de prevenção da Covid-19. Sem mais nem menos, os atletas e seus técnicos foram para a Croácia, como nos bons e velhos tempos em que bastava comprar uma passagem, embarcar e chegar ao destino algumas horas depois.

A atitude negacionista faz parecer que esses atletas vieram de outro planeta. E, logo após chegarem à Terra, resolveram rumar para o Bálcãs, sacar suas raquetes e celebrar a vida para provar que toda essa história de pandemia é pura balela.

Tudo bem que essa atitude não difere muito de tantos governantes por aí que afirmam categoricamente que essa pseudo doença não passa de elucubrações histéricas daqueles que desejam derrubar o sistema capitalista e suas maravilhas.

Que lamento. Lamento pela saúde dos contaminados e pelos danos à saúde psíquica já debilitada de tantos atletas mundo afora que desejam com todas as suas forças voltar a treinar para ter a chance de ainda competir em uma edição olímpica que parece cada vez mais distante de acontecer.

Isso prova que a imagem poderosa do atleta pode ser aquilo que for feito dela. Em si mesma, ela não é boa, nem ruim. Por mais que as potências do marketing esportivo digam o contrário. O senhor das raquetes provou isso.

O mesmo sujeito que convidou o gandula, durante uma partida, a se sentar em seu banco, beber de sua poção mágica e desfrutar da sombra proporcionada pelo seu guarda-sol, também provocou a contaminação de quatro colegas de quadra, além de técnicos e familiares, por puro capricho. Ou onipotência. Ou arrogância.

Sei que isso não espanta a muitos, afinal, se presidentes também agem de forma displicente, saindo às ruas sem máscara nem cuidado com quem divide o mesmo ambiente, por que estranhar que um atleta também o fizesse?

E assim, estádios, ginásios e quadras começam a ser abertos, sem que isso signifique normalidade. Nada disso. Estamos ainda bem longe desse momento.

A angústia da passagem de um tempo que exige distanciamento e isolamento não é apenas de atletas. Ela é de todos aqueles que se sentem distantes de suas atividades produtivas.

Seria perfeito se essas pessoas pudessem usar a força de suas imagens para ajudar a promover ações que facilitassem a superação desse momento. Mas, como diria o príncipe shakespeariano, "há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia".

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