Katia Rubio

Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

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Katia Rubio
Descrição de chapéu Tóquio 2020

Compreendo o desejo de seguir rumo aos Jogos Olímpicos, mas não ignoro os riscos

Princípio olímpico da igualdade está quebrado, muito embora todos batalhem pela excelência

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Já cantava o poeta Cazuza, o tempo não para. Diferentemente do filme “O Feitiço do Tempo”, sobre o dia da marmota, cujo roteiro descreve uma cena que volta a acontecer todos os dias em função de um evento específico, nossos dias são marcados por 24 horas.

Queiramos ou não, gostemos ou não, estamos imersos na realidade produzida pelo desencadear de fatos que nos atormentam. Desculpem, não há como falar de esporte, arte, política e sociedade do presente sem nos referirmos à pandemia de Covid-19.

Gostaria de falar apenas da aproximação dos Jogos Olímpicos de Tóquio, afinal faltam menos de cem dias para a cerimônia de abertura.

Sua realização extemporânea será lembrada no futuro pelos estudiosos do olimpismo como uma edição extraordinária em virtude do caos humanitário provocado por um vírus incontrolável, pela insensibilidade de alguns líderes e pela falta de responsabilidade e liderança de outros. Será comparada com as interrupções ocasionadas apenas pelas Grandes Guerras Mundiais em 1916, 1940 e 1944.

Lembrando que em 1940 as medalhas já tinham sido cunhadas e depois se tornaram valiosas peças para colecionadores. Ou ainda, em 1944, numa demonstração de que Jogos Olímpicos são muito mais do que competição, foi celebrado algo como um encontro dentro de um campo de concentração marcado por premiar os participantes com medalhas de papel.

Escrevo essas considerações também ponderando que, nesses menos de cem dias, muitas coisas poderão acontecer. Vale destacar que 72% da população japonesa deseja que os Jogos Olímpicos sejam transferidos para outra data ou que não ocorram, segundo pesquisa recente.

Na medida do impossível está dando para se viver, como canta a roqueira Rita Lee, e ninguém melhor que os anfitriões para afirmar essa máxima. Com todo o cuidado que está sendo tomado por quem considera a Covid-19 mais do que uma gripezinha, é difícil realizar uma festa mesmo para convidados da mesma casa, com artistas vindos de fora.

Ao longo desse longo ano de pandemia não foram poucas as dificuldades vividas por atletas para chegarem a competir em Tóquio. O isolamento comprometeu treinamentos e competições preparatórias. Outros tantos foram contaminados com menor ou maior grau de sequelas. Algumas equipes não conseguem viajar porque muitos países impedem que brasileiros passem por suas fronteiras. Ou seja, o princípio olímpico da igualdade está quebrado, muito embora todos batalhem pela excelência. E isso é inspirador.

Em um momento em que todos buscam resguardar o seu trabalho, os atletas tentam se manter vivos. Pesquisa recente do UOL mostra como é difícil para eles ser a favor ou contra o objetivo maior da vida. Poucos têm a certeza de um novo ciclo olímpico e a continuidade da carreira em quatro anos. Esse é um dado que assombra muitos atletas que conheço. Quanto tempo ainda resta para o fim?

Claro que compreendo o desejo de seguir rumo aos Jogos Olímpicos, a qualquer preço. Nem por isso meu coração fica menos apertado diante dos riscos. As bolhas têm mostrado problemas, porque elas são permeáveis quando justificativas de ordem pessoal se impõem.

Nas modalidades coletivas, essa variável é potencializada pelo número de pessoas envolvidas nas atividades. Mães e pais estão aflitos para verem seus filhos e filhas que também estão saudosos de seus pais, maridos e esposas.

E o vírus, indiferente a tudo isso, segue contaminando, provando a impotência de humanos arrogantes.

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