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Fragmentação do voto e desconfiança minam governabilidade no Equador

Apesar de discurso Correa-anticorreísmo, urnas respondem às diferenças regionais

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Juan Francisco Camino

Professor na Universidade dos Hemisférios, em Quito (Equador), e mestre em relações internacionais pelo Instituto de Altos Estudos Nacionais (Equador) e em ciência política pela Universidade de Salamanca (Espanha).

As recentes eleições equatorianas têm sido uma das mais atropeladas da história recente do país. A fragmentação do voto e a desconfiança institucional, presente hoje mais do que nunca, funcionam como um obstáculo à governabilidade. Entretanto, além disso, a incompetência do Conselho Nacional Eleitoral e a ascensão do movimento indígena são dois dos traços mais característicos do processo eleitoral.

Desde a convocação das eleições, as disputas entre o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), o órgão encarregado de organizar o processo, e o Tribunal Contencioso Eleitoral (TCE), responsável por resolver as controvérsias em matéria eleitoral, provocaram demoras na confirmação das organizações políticas autorizadas a concorrer nas eleições gerais de 7 de fevereiro.

Os dois partidos que enfrentaram mais problemas para sua aprovação foram o Centro Democrático (CD), liderado por Andrés Arauz e apoiado pelo ex-presidente Rafael Correa, e o Movimiento Justicia Social, do várias vezes candidato Álvaro Noboa Portón. Enquanto o primeiro conseguiu apresentar seus candidatos, o partido de Noboa foi deixado de fora da corrida, mas seu processo ante ao TCE vai continuar.

Andrés Arauz, candidato mais votado no primeiro turno, acompanha sua avó em votação em Guayaquil
Andrés Arauz, candidato mais votado no primeiro turno, acompanha sua avó em votação em Guayaquil - Santiago Arcos - 7.fev.2021/Reuters

Entretanto, esta não tem sido a única controvérsia. No início de janeiro, e com cerca de 40% dos votos para a eleição do presidente e vice-presidente impressos, tornou-se evidente que havia um erro neles, pois o nome e o logotipo do Movimiento Amigo tinham erros.

Isto resultou em uma perda econômica de US$ 500 mil para o Estado, além de numerosas críticas por sua ineficiência. Da mesma forma, durante o início do dia da eleição houve alguns inconvenientes, como a ausência dos membros das Juntas Receptoras dos Votos (JRV), a demora na sua instalação e longas filas para entrar nos recintos eleitorais.

A ascensão do movimento indígena

Apesar dos obstáculos e dificuldades, agravados ainda mais por um contexto de pandemia, as eleições foram realizadas em 7 de fevereiro. Nessa mesma noite, após uma rápida contagem realizada pela CNE, foi anunciado que a coalizão União pela Esperança, liderada por Arauz, havia obtido 31% do total de votos válidos.

A surpresa veio com o segundo candidato mais apoiado, Yaku Pérez de Pachakutik, que teve 20,04% dos votos. Em terceiro lugar, com 19,97% dos votos, estava Guillermo Lasso, cabeça do Movimento CREO. Entretanto, com o avanço do escrutínio, Pérez caiu para o terceiro lugar e, com apenas 20.000 votos de diferença, Lasso foi para o segundo turno.

Yaku Pérez, candidato à Presidência do Equador, durante reunião do Conselho Nacional Eleitoral, em Quito - Santiago Armas - 12.fev.21/Xinhua

A possibilidade de Yaku Pérez alcançar o segundo turno gerou grandes expectativas para a possibilidade de ter, pela primeira vez, um presidente indígena. Por esta razão, quando a contagem dos votos avançou e a Lasso ultrapassou o líder de Pachakutik, algumas vozes expressaram dúvidas sobre a confiabilidade do processo.

Esta desconfiança em relação aos resultados não é algo novo: já em 2017, na votação entre o mesmo Guillermo Lasso e Lenin Moreno, uma suposta fraude do primeiro candidato foi denunciada. No entanto, o assunto não foi mais longe devido à ausência de provas.

Desconfiança institucional e eixos de fratura

O Equador é um país cujas instituições democráticas não têm gozado tradicionalmente de altos níveis de credibilidade. Portanto, se a esta desconfiança estrutural forem acrescentados os contínuos erros logísticos e de comunicação que têm acompanhado o processo eleitoral atual, não seria estranho que, para o segundo turno das eleições de 11 de abril, aumentassem as dúvidas sobre o resultado das eleições.

Isto não só afetaria a percepção dos cidadãos sobre as instituições, mas também colocaria o próximo presidente da República em uma situação delicada.

Junto com o aumento da desconfiança, os resultados refletem outras três dinâmicas evidentes na política atual do Equador: a persistência da divisão regional, uma profunda crise no espectro centro-direita, e que a "invencibilidade" do Correísmo desapareceu.

A clivagem regional é evidente na distribuição de votos entre os candidatos: enquanto Arauz concentrou a maioria de seus votos na costa, onde obteve uma média de 42,94%, na região serrana Yaku Pérez foi o vencedor na maioria das províncias. Assim, apesar de no discurso dos atores políticos persistir o eixo do Correa-anticorreísmo, na prática a distribuição do voto responde em maior medida às diferenças regionais.

Com relação à crise nos partidos de direita e centro-direita, após oito anos de campanha e três eleições consecutivas, Lasso não conseguiu consolidar sua proposta conservadora como a grande alternativa política ao partido no governo.

Em comparação com os resultados das eleições de 2017, onde obteve 28% dos votos no primeiro turno, em cinco anos ele perdeu quase 10% do seu eleitorado. Os resultados das eleições legislativas reforçam a crise das forças conservadoras. Das 137 cadeiras, apenas 23,33% serão compostas por legisladores desta tendência (Movimento CREO, Partido Social Cristão, Movimento Equador Unido e Construye).

Finalmente, o correísmo não é mais uma força imbatível. Seu candidato, Andrés Arauz, obteve cerca de 7% menos de apoio do que seu antecessor, apesar da presença contínua de Correa em sua campanha.

Apesar das expectativas de vencer na primeira rodada, será necessário um segundo turno. Além disso, se ele ganhar no segundo turno, será um governo minoritário, pois não conseguiu obter os 69 deputados necessários para controlar o parlamento.

Fragmentação e desencanto

Estas eleições, além das sombras geradas pelo péssimo desempenho do Conselho Nacional Eleitoral, caracterizam-se por deixar um cenário político diferente do que o Equador teve na última década. Por um lado, a divisão das votações é clara. Por outro lado, o surgimento do movimento indígena como uma opção eleitoral sólida que não só tem opções nas províncias com maior população indígena (Cotopaxi, Chimborazo, Tungurahua, Cañar), mas também conquista votos nos centros urbanos populares (por exemplo, no centro-sul da cidade de Quito ou na província de Azuay).

O eleitor de direita ou centro-direita tem poucos motivos para ter esperança. Desde 1998, nenhum partido desta tendência ganhou uma eleição presidencial. Os correístas têm motivos para se preocupar. O ex-presidente Correa não é mais seu antigo “eu” e os candidatos de seu movimento nem sempre são a escolha vencedora.

Arauz terá que competir no segundo turno sabendo que seus detratores tentarão estimular a votação de qualquer outra opção para evitar que o ex-presidente e sua longa sombra retornem ao país.

Em meio às eleições mais atropeladas dos últimos 20 anos, com a distribuição do poder entre quatro forças políticas do poder legislativo, o que gerará um governo muito fraco, e sob uma sombra de desconfiança institucional. Quo Vadis, Equador?

Tradução de Maria Isabel Santos Lima

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