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A eleição do Equador e o 'corsi e recorsi' da política latino-americana

Vitória de Lasso confirma regra na região de que o vencedor supera todas as especulações, análises e pesquisas

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Diego M. Raus

Diretor da licenciatura em Ciência Política e Governo da Universidade Nacional de Lanús (Argentina) e professor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires

No início do século 18, o filósofo italiano Giambattista Vico propôs entender o desenrolar da história humana como um "corsi e "ricorsi" indefinidos, ou seja, uma repetição sucessiva de processos e eventos, reconfigurados, mas repetidos em sua essência última.

Algo como o Eterno Retorno de Nietzsche, mas sem tanta carga ideológica.

Os resultados das eleições no Equador parecem, para a política latino-americana das últimas décadas, confirmar essa visão da história.

Em controvérsia com outros cenários políticos mais previsíveis, no sentido de que uma disputa eleitoral pode ser fechada, mas seu resultado final não surpreende em seu significado e impacto, a eleição de Guillermo Lasso confirma a regra política latino-americana: o vencedor surpreende e supera todas as especulações, análises e pesquisas anteriores.

O presidente eleito do Equador, Guillermo Lasso, concede entrevista em um hotel em Quito
O presidente eleito do Equador, Guillermo Lasso, concede entrevista em um hotel em Quito - Rodrigo Buendia - 12.abr.2021/AFP

Por que Arauz venceria?

Após as eleições gerais, em que era óbvio que a votação, se houvesse, seria entre o correísta Andrés Arauz e o liberal Lasso, surpreendentemente houve alguns dias em que não se sabia se o segundo era realmente Lasso, ou o líder da Conaie (Confederação Nacional Indígena do Equador) Yaku Perez.

A confortável liderança de Arauz naquele primeiro turno (33% dos votos) enfrentou uma segunda minoria indecisa entre Lasso e Yaku, ambos com 19% dos votos.

O correísmo de Arauz temia que os votos fossem para a Yaku porque, embora as relações entre Rafael Correa e Conaie fossem muito conflituosas no segundo mandato do ex-presidente, supunha-se que ambos competiam mais ou menos pelo mesmo eleitorado.

Por outro lado, uma eleição com Lasso, um neoliberal e um homem do establishment financeiro, os fez pressupor uma vitória previsível.

Por sua vez, o anticorreísmo quis manter o segundo lugar de Yaku pelas mesmas razões e objetivos: o líder da Conaie "mordia" votos para Arauz e somava, por medo e não por amor, como disse Borges, os eleitores de Lasso.

Mas Lasso ganhou

Após as eleições de 11 de abril, Lasso obteve, surpreendentemente, uma vitória eleitoral, se não confortável, cômoda. Daquelas que não deixam espaço para os derrotados reivindicarem: 52,5% a 47,5%.

Mais uma vez, a política latino-americana surpreendeu tanto os locais quanto os estrangeiros.

As primeiras análises desdobram uma série de perguntas para explicar uma vitória eleitoral tão surpreendente.

Em primeiro lugar, o reperfilamento da campanha de Lasso, projetada pelo inefável Jaime Duran Barba, que procurou se abrir a setores e questões fora de sua ideologia mais conservadora (gênero, ambiente, minorias).

Em segundo lugar, a agenda estabelecida por Lasso obrigou Arauz a um confronto discursivo defensivo.

Terceiro, o fato de as comunidades indígenas terem virado as costas para Arauz foi confirmado pela votação.

E, finalmente, o furioso anticorreísmo de uma grande parte dos setores médios urbanos.

É verdade que esses e outros fatores são heterogêneos, incomparáveis, difusos e difíceis de medir.

Mas, evidentemente, algo os fez convergir em uma opção não desejada por muitos, mas tomada como "o mal menor".

O que, naturalmente, influenciará mais tarde na gestão do novo governo, uma vez terminada a efêmera glória da posse presidencial.

Algumas chaves para a política latino-americana no século 21

Evidentemente, as eleições no Equador, no Peru, na Bolívia, no Uruguai, no Brasil e na Argentina, ou seja, nos últimos dois anos, mostram um cenário político muito flutuante.

Até pouco mais da segunda década deste século, havia uma clara predominância de governos progressistas, com a diversidade do progressivismo na América Latina (esquerdas, centro-esquerdas, social-democratas, populistas).

A partir daí, foi observado um incipiente giro político-ideológico, que ficou conhecido como o "giro à direita" na política da região.

Mas nos últimos anos a oscilação entre direita e esquerda, com tudo o que está no meio ideológico, não parece mais seguir um padrão claro.

As eleições não somente posicionam governos de uma cor ou outra, mas essas indefinições são observadas dentro dos próprios governos.

Basta observar o componente evangélico de governos "esquerdistas" como o de López Obrador no México (que inclui ex-políticos do conservador PAN) e o de Daniel Ortega na Nicarágua.

Há as fortes divisões internas do governo do MAS na Bolívia, que, dois meses após a eleição presidencial e a vitória, sofreu duas derrotas nas eleições departamentais e municipais.

No Peru, nas recentes eleições houve seis candidaturas que obtiveram de 8% e 16% dos votos, em um arco que vai de uma extrema direita para uma esquerda radical.

A possível nova candidatura de Lula está crescendo no Brasil, ao mesmo tempo em que retarda a queda no apoio a Jair Bolsonaro.

O Chile adiou uma eleição (Reforma Constitucional) que é uma aspiração da centro-esquerda e, ao mesmo tempo, uma válvula de escape para o governo liberal de Sebastián Piñera.

Em resumo, a América Latina é uma região particular em muitos aspectos. Naturalmente, a política não poderia ser menos. Imprevisibilidade, altos e baixos, euforia e depressão, períodos de auge econômico e crise fulminante. Esquerdas e direitas.

Talvez somente retornando ao boom literário dos anos 1960 e seu realismo mágico poderemos dar pistas para uma compreensão mais empírica e metodologicamente definida para encontrar certos padrões de nosso comportamento político.

Entretanto vamos ser cautelosos em nossa análise prospectiva. Afinal de contas, os pesquisadores de opinião pública têm mais dificuldade.

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