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Há um aumento da participação política das mulheres no Brasil?

Medidas de incentivo por meio da legislação apresentam resultados que, embora tímidos, parecem promissores

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Soraia M. Vieira

Doutora em ciência política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp/Uerj) e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF)

Luciana Santana

PhD em ciência política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e professora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal)

A presença das mulheres na política pressupõe uma maior representação e tem, por si, um caráter didático: quanto mais mulheres atuando na política, maior é o incentivo para que outras mulheres se postulem a cargos públicos.

No entanto, menos de 15 em cada 100 deputados do Legislativo federal brasileiro são mulheres.

Essa ampla distorção se repete em outros órgãos representativos, o que contribui para a invisibilidade da condição da mulher, bem como de suas demandas e interesses.

A participação política das mulheres no Brasil é inferior à de outros países da América Latina e do mundo.

De acordo com o ranking de 2017 da participação das mulheres nos Parlamentos, elaborado pela ONU Mulheres e pela União Interparlamentar (IPU), o Brasil ocupa a 154ª posição entre 174 países analisados.

Em média, na América Latina e no Caribe, um terço dos legisladores são mulheres, o que é mais que o dobro do número registrado no Legislativo brasileiro. Isso faz do Brasil o país com menos mulheres no Parlamento na América do Sul.

A participação das mulheres na vida política enfrenta vários desafios.

Em primeiro lugar, seu papel no núcleo familiar, ainda muito vinculado ao cuidado de crianças e idosos, as coloca em desvantagem em relação aos homens.

Além disso, o machismo estrutural da sociedade brasileira ainda considera a política como um campo de atuação masculino.

Finalmente, há uma clara falta de incentivos nos partidos e no sistema político em geral para uma maior inclusão.

A deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), eleita em 2018, gesticula na CPMI das Fake News, em Brasília
A deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), eleita em 2018, gesticula na CPMI das Fake News, em Brasília - Pedro Ladeira - 4.dez.2019/Folhapress

Mudanças na legislação

Algumas medidas foram adotadas a fim de enfrentar esses desafios.

Desde 1995, várias normas legais foram aprovadas e implementadas visando incentivar e garantir a participação das mulheres nos processos eleitorais e, assim, aumentar sua presença em cargos representativos.

A lei 9.100/95 determinou que no mínimo um quinto dos candidatos de cada partido ou coalizão eleitoral a cargos legislativos deveriam ser mulheres.

Dois anos depois, em 1997, a Lei de Eleições ampliou o alcance da legislação anterior e estipulou que cada partido deveria apresentar no mínimo 30% de mulheres candidatas a cargos legislativos.

No entanto, a ausência de penalidade em caso de não cumprimento prejudicou a eficácia dessa norma.

Apenas em 2009, após uma nova modificação da legislação, foi possível tornar obrigatório o cumprimento desse percentual mínimo para candidaturas femininas.

Continuando com essa tendência de reformas para maior inclusão da mulher na política, em 2015 o Congresso brasileiro aprovou uma lei que obriga os partidos a destinar recursos do fundo partidário –o financiamento público que recebem os partidos– às campanhas políticas das mulheres.

No entanto, essa lei criou uma desigualdade formal entre homens e mulheres, pois estabeleceu que um mínimo de 30% das candidaturas femininas teria acesso a um máximo de 15% dos recursos financeiros.

A lei foi posteriormente declarada inconstitucional por dificultar a equidade de gênero, ficando estabelecido que o financiamento partidário deveria ser proporcional entre as candidaturas femininas e masculinas.

O impacto da legislação

Desde as mudanças na legislação, o número de mulheres candidatas, tanto aos cargos legislativos como aos executivos, aumentou.

Porém esse aumento não se traduziu em um incremento proporcional de mulheres eleitas, o que sugere que muitas candidatas têm poucas chances reais na competição eleitoral.

O aumento mais expressivo na representação feminina ocorreu, paradoxalmente, nas últimas eleições legislativas de 2018, quando Bolsonaro –candidato de extrema direita e misógino– foi eleito presidente.

Naquele ano, em comparação com as eleições de 2014, houve um aumento de 52,6% de mulheres eleitas para a Câmara dos Deputados, passando de 53 para 77 deputadas.

Em nível subnacional, nas Assembleias Legislativas o aumento foi de 41,2%, enquanto no Senado não houve mudança e a representação feminina permaneceu em 13%.

Nos cargos executivos, a situação é ainda mais desigual.

No caso dos governos dos estados, desde a redemocratização nos anos 1990, em quase todas as eleições foram eleitas apenas uma ou duas governadoras, em um total de 27 estados.

No entanto, o número de candidatas a governadoras aumentou de 21 para 31 entre as eleições de 2014 e 2018. No mesmo período, o número de candidatas a vice-governadoras subiu de 45 para 75.

Em nível local, o mesmo padrão se repete, com um aumento maior na porcentagem de mulheres candidatas do que as eleitas.

Nas últimas eleições municipais, em novembro de 2020, apenas 16% dos cargos de representação política foram conquistados por mulheres, enquanto as candidatas femininas representaram um terço do total de candidaturas.

Embora esse porcentual seja um recorde em eleições municipais, ainda está muito abaixo da proporção de mulheres na sociedade brasileira, que é mais da metade da população.

As medidas de incentivo à participação política por meio da legislação apresentam resultados que, embora tímidos, parecem promissores, principalmente quando se trata de competição para os cargos legislativos.

Embora a presença de mulheres em cargos executivos ainda seja muito baixa, a legislação teve um impacto positivo sobre o número de mulheres candidatas a governadoras e estimulou uma mudança na estratégia dos partidos, que apresentam um maior número de chapas mistas, embora na maioria dos casos com a mulher como vice.

Outras estratégias possíveis

Apesar desses avanços, é necessário continuar aumentando a participação das mulheres.

Isso pode ser feito por meio dos partidos políticos, com incentivos à participação das mulheres nos órgãos diretivos; com a ocupação de cargos estratégicos que ampliem sua visibilidade junto ao eleitorado; e apoiando as candidaturas de mulheres para que se tornem competitivas e com potencial de sucesso eleitoral.

Além disso, as quotas de gênero devem ser substituídas por quotas de representação, ou seja, reservar cadeiras parlamentares exclusivamente para mulheres.

Também é essencial incentivar a participação de mulheres negras e indígenas e desenvolver políticas para aumentar a conscientização da sociedade sobre a importância do aumento da representação das mulheres na política.

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