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Quando o princípio da não intervenção é utilizado para proteger regimes

Sociedades são prejudicadas quando governantes recorrem ao princípio para evitar compromissos na área dos Direitos Humanos e na defesa da democracia

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Fabián Bosoer

Cientista político, jornalista, editor-chefe da seção de opinião do diário argentino Clarín, professor da Universidad Nacional de Tres de Febrero e da Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais).

Na década de 1960, a defesa do princípio da não interferência custou aos presidentes argentinos Arturo Frondizi (1962) e Arturo Illia (1966) os seus governos, entre outras razões, por se oporem à intervenção dos EUA em Cuba e na República Dominicana.

A defesa desse princípio por estes governos, derrubados por militares que encontraram apoio em Washington, justificou-se para proteger os nossos países da intervenção aberta dos EUA e da URSS no quadro do confronto Leste-Oeste que caracterizou a Guerra Fria.

Na década de 1970, foram as ditaduras militares anticomunistas que mantiveram este princípio para responder às denúncias do Departamento de Estado, sob a presidência de James Carter, sobre as violações dos Direitos Humanos que estavam a ser perpetradas a sul do Rio Grande.

Depois veio Ronald Reagan, nos anos 80, e a interferência tomou uma direção diferente: o objetivo de Washington era evitar que a Nicarágua se tornasse "outra Cuba" às portas do Império, após a Revolução Sandinista que derrubou a velha ditadura de Anastasio Somoza.

E foi o Presidente argentino Raúl Alfonsín que respondeu a Reagan, no relvado da Casa Branca em 1985, que a América Latina tinha de sair da Guerra Fria; que não era a escolha entre revolução e contrarrevolução que estava em jogo, mas sim a escolha entre ditaduras e democracias.

O ditador da Nicarágua Daniel Ortega em evento pelo 39º aniversário da Revolução Sandinista - Oswaldo Rivas/Reuters

Quarenta anos depois, o líder daquela revolução nicaraguense, Daniel Ortega, fecha o círculo 360° e toma o lugar do ditador que ele expulsou. Tornou-se um novo Somoza, reprimindo protestos, silenciando vozes críticas, prendendo líderes da oposição e procurando perpetuar-se no poder. E como os ditadores de outrora face a Carter, juntamente com outro autocrata como Nicolás Maduro, denunciam a “interferência externa” e tentam distrair a atenção de seu governo ditatorial acusando o “imperialismo americano”, remontando aos tempos da Guerra Fria.

Lamentavelmente, o governo argentino cedeu a esta visão regressiva, que confunde cenários históricos, abstendo-se – juntamente com o México – de condenar na OEA a repressão exercida pelo governo nicaraguense e exigindo a libertação dos líderes da oposição detidos.

O texto foi aprovado por 26 votos – incluindo os Estados Unidos, Chile, Colômbia e Peru – durante uma sessão extraordinária do Conselho Permanente da OEA, o órgão executivo do bloco regional. A Bolívia e São Vicente e Granadinas votaram contra, enquanto a Argentina, Belize, Dominica, Honduras e México se abstiveram. A delegação nicaraguense condenou a interferência da organização multilateral e acusou os Estados Unidos de prosseguir uma “política intervencionista”.

O comunicado oficial que explica a abstenção da Argentina e do México na votação da OEA afirma que “não concordamos com os países que põem de lado o princípio da não intervenção nos assuntos internos, tão caro à nossa história”.

Isso ignora todo o caminho percorrido nos últimos quarenta anos de compromissos e instrumentos regionais, hemisféricos e internacionais, jurídicos e políticos em defesa dos Direitos Humanos e da democracia.

O argumento de que tais instrumentos só são aplicados por países poderosos contra países fracos por conveniência geopolítica é geralmente um álibi utilizado por governantes e regimes que espezinham as suas sociedades, assediam os seus críticos ou limitam as suas liberdades, não importa em nome de que ideologias, e claro, não querem que nenhum “poder estrangeiro” interfira nos seus assuntos.

Do mesmo modo, o argumento de “dois pesos e duas medidas” ou “hemiplegia” de que qualquer política internacional de princípios invalida a possibilidade de reconhecer os avanços no Direito humanitário internacional e compromissos internacionais em favor da democracia.

Quando o princípio da “não-intervenção” é utilizado para evitar compromissos regionais, hemisféricos e internacionais na área dos Direitos Humanos e da defesa da democracia, não se protege as sociedades, mas sim os regimes e os governantes que as prejudicam.

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