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A violência política contra as mulheres na América Latina

É importante ter em mente que não se trata de um fato isolado, mas de ações que supõem uma escalada

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Dhayana Fernández-Matos

Cientista política, advogada, professora da Universidad Central de Venezuela e pesquisadora da Universidad Simón Bolívar (Colômbia)

Foi dito incansavelmente que a violência contra as mulheres – embora seja correto dizer as violências por suas inúmeras manifestações – responde às assimetrias de poder entre homens e mulheres, que mantêm estas últimas numa situação de exclusão, subordinação e desvantagem.

Em relação à violência que as mulheres sofrem na vida política, a sua conceptualização e abordagem são novidades porque só recentemente começou a manifestar-se, visto a partir de uma perspectiva histórica. Tem sido a participação das mulheres nos espaços políticos que tem gerado ataques e agressões que buscam obstaculizar, impedir e limitar o exercício de seus direitos políticos.

O que ocorre na América Latina?

O aumento do número de mulheres políticas – conselheiras, parlamentares, candidatas e quaisquer outros cargos públicos por designação ou por via eleitoral – no final do século XX e início do século XXI, foi acompanhado pela visibilidade de uma série de agressões sofridas por aquelas que se atreviam a participar na arena político-eleitoral. Foram os movimentos de mulheres e feministas que tornaram esta realidade visível.

O desenvolvimento de mecanismos para o avanço das mulheres nos espaços políticos, primeiro através de cotas de gênero e depois com a paridade – que tem sido progressivamente incorporada em vários países latino-americanos – implicou a superação de certas barreiras formais que impediam a sua participação. Mas as barreiras informais seguem vigentes, e uma das suas expressões é precisamente a violência que sofrem as que se atrevem a intervir nos espaços públicos.

Cabe destacar que, nestes casos, embora a violência possa ser dirigida individualmente a uma mulher, a mensagem é para todas as mulheres: os espaços políticos não são para elas e são os homens que têm a capacidade de governar.

Ao analisar este tipo de violência, é também importante ter em mente que este não é um fato isolado, mas se trata de um conjunto de ações que frequentemente supõem uma escalada que pode terminar num feminicídio.

Lamentavelmente se pode mencionar os assassinatos de mulheres líderes em distintos países da América Latina: Juana Quispe na Bolívia, Berta Cáceres nas Honduras, Marielle Franco no Brasil e o caso do México, que apresenta o maior número com 23 mulheres políticas assassinadas em 2018. Em 2021, no contexto do maior processo eleitoral que este país alguma vez teve, 21 foram assassinadas.

Características regionais da violência política de gênero

No ano 2007, na Décima Conferência Regional sobre a Mulher na América Latina e Caraíbas, celebrada em Quito, os governos da região comprometeram-se a adotar medidas, tanto legislativas como institucionais, para enfrentar o assédio político e administrativo contra as mulheres que acessam os espaços políticos. Nesse momento, não havia qualquer menção à violência política, e apesar do compromisso, foi necessário esperar 5 anos para que se aprovasse a primeira lei na região que regulamentasse esta problemática de maneira específica.

Em 2015, foi assinada a Declaração sobre a Violência Política e o Assédio contra as Mulheres. Este instrumento reconheceu que, para alcançar a paridade política numa democracia, não basta a implementação de cotas ou da paridade eleitoral. É necessário assegurar que os espaços políticos estejam livres de discriminação e violência contra as mulheres que neles decidam participar.

Em 2016, foi elaborada uma Lei Modelo Interamericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra as Mulheres na Vida Política, na qual foi incluída uma definição bastante ampla que vincula esta violência à afetação dos direitos políticos. “Qualquer ação, conduta ou omissão, realizada de forma direta ou através de terceiros que, baseada em seu gênero, cause dano ou sofrimento a uma ou mais mulheres, e que tenha o objetivo ou resultado de prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício dos seus direitos políticos”.

Esta amplitude conceitual justifica-se porque a nível regional não existe uma definição uniforme do que se entende por violência contra as mulheres na política.

Iniciativas legais

As mulheres têm direito a uma vida livre de violência no espaço político e isto constitui-se em um direito humano que obriga os Estados a os respeitar, garantir e satisfazer. Embora este seja o dever ser, a abordagem legislativa nos países da região tem seguido um caminho desigual.

Bolívia foi um país pioneiro ao aprovar em 2012 a Lei Nº 243, “Lei Contra o Assédio e a Violência Política contra as Mulheres”, que deixou claramente estabelecido que se trata de uma lei de proteção integral que busca não só sancionar os agressores, mas também atender às vítimas e estabelecer mecanismos de prevenção. Foi a primeira vez que uma lei definiu o assédio e a violência contra as mulheres na política. Estes avanços devem-se ao trabalho realizado pela Associação das Conselheiras Bolivianas (ACOBOL) e pelo movimento de mulheres, que conscientizaram sobre este tipo de agressão e colocaram o tema na agenda nacional.

Até pouco tempo, a Bolívia era o único país do continente que tinha uma lei específica sobre esta problemática, mas em 4 de Agosto de 2021, o Brasil aprovou a Lei Nº 14.192, que estabelece um conjunto de regras para prevenir, reprimir e combater a violência política contra as mulheres em espaços e atividades relacionadas com o exercício dos seus direitos políticos e de suas funções públicas.

Alguns países como Equador, México e Paraguai tem incorporado, dentro dos artigos das leis gerais sobre violência contra as mulheres baseada no gênero, esta tipologia. Outros têm ou tiveram projetos e iniciativas legislativas, como é o caso de Colômbia, Costa Rica, Honduras e Peru, que não foram convertidos em leis.

Neste último caso, entre as razões que explicam que a lei não termine de ser aprovada está o desconhecimento sobre este tipo de violência e, por outro lado, o temor que os homens tem de ceder aquilo que tradicionalmente consideravam ser o seu próprio espaço.

É importante destacar que a falta de vontade política na abordagem dessa problemática demonstra a vigência do pacto patriarcal, que não reconhece as desigualdades que as mulheres têm que enfrentar para participar dos espaços políticos, nem mostra que os partidos políticos, que em princípio deveriam ser grandes aliados no combate a este tipo de violência, são muitas vezes os que mais resistem às mudanças.

Entretanto, as mulheres seguem lutando para estar presentes nos espaços políticos e na tomada de decisões.

*Tradução do espanhol por Maria Isabel Santos Lima

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