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Migrar não é um delito

Criminalizar a migração não a detém, só expõe a vida dos migrantes a maiores perigos

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Mairene Tobón Ospino

Professor, pesquisador pós-doutorando no Centro de Estudos de Migração da Universidade dos Andes, Bogotá, e pesquisador júnior do Ministério das Ciências, Tecnologia e Inovação da Colômbia

​​Em 12 de dezembro, em uma tentativa desesperada de chegar aos Estados Unidos, 56 migrantes centro-americanos morreram em uma estrada em Chiapas, México, após o caminhão que os transportava clandestinamente ter tombado. Entre as vítimas superlotadas e não ventiladas haviam jovens, adultos e famílias completas com crianças. Esta história, no entanto, é uma das muitas que se repetem com frequência, seja em caminhão, trem ou balsa. A cada ano, centenas de pessoas perdem suas vidas tentando migrar para outro país.

Desde 2014, mais de 45 mil pessoas morreram no processo de migração internacional, segundo dados do programa Migrantes Desaparecidos da Organização Internacional para as Migrações. As rotas de migração nas Américas são as mais mortais e uma das piores é a fronteira entre o México e os Estados Unidos, com 5.815 mortes.

Embora migrar seja um direito humano, as políticas migratórias restritivas dos países obrigam as pessoas que não atendem aos requisitos para solicitar um visto a se submeterem a viagens perigosas em busca de uma vida melhor. Ao comemorarmos o Dia Internacional das Pessoas Migrantes, queremos pedir uma reflexão sobre o fenômeno migratório na região, a gestão da migração e a necessidade de proteger a vida dessas pessoas.

Caminhão tombado em estrada no México em acidente que deixou mais de 50 migrantes mortos - Jacob Garcia/Reuters

O direito de migrar e as políticas migratórias

Estima-se que 281 milhões de pessoas no mundo são migrantes internacionais. Ou seja, cerca de 3,6% da população mundial. Apesar de se falar frequentemente de uma crise migratória, a verdade é que, em termos percentuais, o número se manteve relativamente estável durante os últimos 20 anos.

​Na América Latina e no Caribe se encontram 14,8% dos migrantes internacionais. Este é um grande desafio para a gestão migratória e a proteção de seus direitos fundamentais.

Embora desde 1948 a Declaração Universal dos Direitos Humanos tenha reconhecido "o direito de todas as pessoas a circular livremente e escolher sua residência no território de um Estado", a livre circulação
está sujeita à proteção do Estado-Nação, que se configura em políticas migratórias.

O principal problema é a securitização das políticas migratórias que, em muitos casos, percebe as pessoas migrantes como uma ameaça à segurança nacional e deixa os direitos humanos em segundo plano. Nesta perspectiva, as medidas que buscam preservar a ordem, além de necessárias, são plenamente justificadas.

Esse foi o caso dos 59 venezuelanos expulsos da Colômbia em 2019, a quem foi atribuída a responsabilidade de protagonizar os atos vândalos em Bogotá durante os protestos sociais daquele ano. Nove deles tomaram medidas legais devido às arbitrariedades da autoridade migratória durante o processo de expulsão. Entre elas, o fato de serem abandonados no meio do rio Orinoco.

Nesse sentido, após um complexo processo legal, a Corte Constitucional se pronunciou ao encontrar que o devido processo e a dignidade humana foram violados, razão pela qual ditou medidas para revogar a expulsão de sete deles e evitar a repetição das irregularidades encontradas no caso. Apesar dos aspectos positivos da decisão, esta situação evidencia uma forma de criminalização da migração e os riscos de colocar a segurança acima dos direitos das pessoas migrantes.

Outro exemplo dos desafios estruturais da população em termos de política migratória é a ausência de um enfoque de gênero e nas crianças. Ações tão alarmantes como a deportação de mulheres grávidas de origem haitiana quando frequentam centros de saúde e hospitais na República Dominicana não podem passar despercebidas. Tampouco os silêncios sobre as crianças vítimas de violência e interseções em contextos migratórios complexos. As múltiplas camadas de direitos na gestão da migração devem ser visíveis e orientar as políticas públicas.

Muro na fronteira dos Estados Unidos com o México, entre as cidades de Novo México e Chihuahua - Patrick T. Fallon/AFP

Migrar em tempos de pandemia

Enquanto a pandemia afetou a todos, os migrantes – como outras populações vulneráveis – enfrentaram maiores dificuldades. As medidas de contenção adotadas pelos países ante a emergência sanitária foram apenas uma delas. O fechamento das fronteiras e o isolamento prolongado para conter a propagação do vírus deixou milhares de pessoas em uma situação ainda pior.

Ademais, sem a possibilidade de retornar a seus países de origem ou completar sua viagem, esta população foi condenada a condições de extrema vulnerabilidade. A condição migratória irregular, em muitos casos, limitou o acesso à vacinação ou aos serviços de saúde, que priorizavam os nacionais ou as pessoas regularizadas. A situação precária dessas pessoas exacerbou o discurso de ódio e as narrativas sobre o perigo que essa população representa para a saúde pública.

Em resumo, os migrantes têm sido vítimas de múltiplas formas de violência que não distinguem idade ou gênero, ligadas à xenofobia e à discriminação. Neste sentido, os Estados associados do Mercosul responderam com uma declaração de compromisso para aumentar os esforços de atenção às suas necessidades e, particularmente, para evitar a discriminação contra esta população sob uma premissa necessária: "Ninguém deve ser deixado para trás, e nenhum direito humano deve ser negligenciado".

Dia Internacional do Migrante: um chamado à ação

Desde 2016, no marco da Declaração de Nova Iorque para Refugiados e Migrantes, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu o dia 18 de dezembro como o Dia Internacional das Pessoas Migrantes. Com isso busca expor a multiplicidade de desafios que enfrentam, as lições aprendidas pelos países de acolhida e, sobretudo, as oportunidades de cooperação para fortalecer a gestão migratória de uma forma segura, ordenada e regular.

Neste sentido, a declaração reconhece as contribuições da população migrante e a necessidade de proteger a segurança, a dignidade e os direitos humanos das pessoas migrantes, independentemente de seu status migratório. Isto levou à ideia de contribuir para o que conhecemos hoje como o Pacto Global para a Migração Segura, Ordenada e Regular, um esforço intergovernamental adotado por mais de 150 países em 2018.

Vale lembrar que muitas dessas pessoas migram por causa das condições em seus países de origem, portanto, falar sobre migração e direitos será sempre complexo. Criminalizar a migração não a detém, só expõe a vida dos migrantes a maiores perigos. O chamado uníssono é para que os governos garantam os direitos humanos na gestão migratória.

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