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As nomeações políticas são sempre clientelistas?

Problema em relação a essa prática não é que ela exista, mas que seja mal controlada

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Emilio Moya Díaz

Professor do Departamento de Sociologia, Ciência Política e Administração Pública da Universidade Católica de Temuco (Chile)

Camila Mella San Martín

Professora do Departamento de Sociologia, Ciência Política e Administração Pública da Universidade Católica de Temuco (Chile)

Nas últimas eleições chilenas, a redução do número de operadores políticos (funcionários públicos nomeados em uma base discricionária que utilizam sua posição para realizar atividades políticas e partidárias) no Estado foi uma das propostas urgentes dos diferentes candidatos, a serem implementadas assim que tomassem posse.

Existe uma concepção geral de que qualquer nomeação discricionária corresponde a um operador político, o que implicaria "clientelismo" ou "patronagem".

No entanto, esse tipo de contratação na estrutura estatal é muitas vezes fundamental, pois eles desempenham funções democráticas transcendentais como a implementação de políticas públicas ou a articulação das relações entre diferentes ministérios, entre outras.

A patronagem é um fenômeno que sempre esteve presente nas democracias do mundo.

Max Weber, em seu famoso texto "Política como uma Vocação", salientou que o objetivo dos partidos políticos nas democracias plebiscitárias era ganhar o poder por intermédio do voto.

Tal conquista, por sua vez, daria aos partidos políticos a legitimidade necessária para nomear seus membros para os diferentes níveis da burocracia estatal.

Entretanto deve-se observar que essa não é a única forma de recrutamento de burocracias estatais.

Por um lado, há a forma profissional, um processo que responde a padrões normativos e, portanto, é formalmente baseado em princípios de meritocracia e transparência.

Por outro lado, existe a forma de patronagem, um mecanismo de recrutamento no qual os partidos políticos desempenham um papel crucial.

Nisso, as nomeações são baseadas em critérios políticos com o objetivo, entre outros, de controlar melhor as políticas que são implementadas, já que se assume que esses funcionários têm um maior compromisso com o programa e com a administração do governo.

Na prática, as duas modalidades de recrutamento se sobrepõem.

No caso do Chile, e com base em estudos nacionais e locais que realizamos sobre essa questão na Universidade Católica de Temuco, a nomeação política ou a patronagem não pode ser reduzida ao simples fato de se nomearem operadores políticos no Estado.

Os estudos mostram uma heterogeneidade de clientelismo na burocracia estatal chilena: existem diferenças de acordo com as funções a serem desempenhadas, as características do nomeado e o nível hierárquico em que a nomeação é feita.

Com relação às funções desempenhadas pelos nomeados, há três principais.

Primeiro, obter ganhos eleitorais, que seria uma forma de patronagem que conteria elementos e dinâmicas de clientelismo político e cujo objetivo é recompensar os militantes e executar políticas eleitorais.

Segundo, garantir que o governo e seus funcionários atuem de acordo com as diretrizes do partido político ou autoridade no poder, articulando e controlando a burocracia.

Terceiro, projetar e implementar políticas públicas.

Com relação às características da pessoa contratada, para a primeira função –centrada em assuntos eleitorais– prevaleceriam os articuladores e clientes políticos.

Na segunda função –orientada para o funcionamento do governo– prevaleceriam os chamados operadores, quadros e comissionados.

Para a terceira função –orientada para políticas públicas– seriam nomeados especialistas como tecnocratas e "technopols".

Com relação ao nível hierárquico, estudos tanto a nível nacional (Moya e Garrido, 2019) quanto regional (Moya et al, 2021) mostram que na administração pública chilena, em todos os níveis da estrutura burocrática, seja nacional ou regional, há nomeações políticas, mas não há um tipo homogêneo de patronagem.

Níveis hierárquicos

Na verdade, isso varia de acordo com o nível hierárquico analisado.

No nível superior existe um patrocínio associado a tecnocratas e "technopols", que mobilizam recursos gerenciais mas que também têm a capacidade de articulação.

No nível hierárquico médio, o clientelismo está associado aos operadores políticos e mobiliza principalmente recursos organizacionais.

Nos níveis inferiores, é visível o patrocínio relacionado a clientes e ativistas de partidos políticos que mobilizam recursos eleitorais.

Estudos anteriores também indicam que os partidos políticos são importantes nas nomeações, mas que perderam relevância desde o retorno da democracia.

Parlamentares, ONGs, grupos de reflexão e sindicatos são atores que vieram a disputar a área de influência dos partidos políticos nas nomeações.

Da mesma forma, no nível nacional, a figura presidencial desempenhou um papel fundamental nas nomeações no período analisado, e a confiança pessoal (mais que a confiança partidária) parece ser um critério importante para as nomeações, especificamente no nível hierárquico mais alto.

No nível regional, a situação é semelhante no que diz respeito ao perfil das pessoas que são indicadas.

Por exemplo, a figura do "technopol" é altamente considerada como uma pessoa com habilidades tanto técnicas quanto políticas.

Entretanto, os líderes partidários e ativistas que trabalharam anteriormente em períodos eleitorais são frequentemente favorecidos para assegurar a conexão entre o partido e o eleitorado.

Os nomeados se baseiam principalmente na confiança pessoal, mais do que na política, especialmente dos parlamentares da região.

Embora os partidos políticos nomeiem pessoas para garantir o poder, tais nomeações requerem o consentimento dos parlamentares mais que do partido político, especificamente em favor de senadores ou deputados.

Essa prática, por sua vez, serve ao propósito de proteger os interesses dos parlamentares, garantindo-lhes apoio eleitoral.

Qual é o problema com o clientelismo? Não que ele exista, mas que o clientelismo seja mal controlado.

Nesse sentido, sua falta de controle afetaria diretamente a gestão pública, pois poderia impedir a profissionalização dos funcionários, com repercussões na eficiência e na eficácia do trabalho do Estado.

O problema, portanto, surge quando os funcionários nomeados não possuem necessariamente as habilidades e competências para cumprir a função pública pela qual são responsáveis.

Quando isso acontece, a desconfiança dos cidadãos aumenta e a percepção da corrupção nas nomeações políticas no Estado cresce.

Agradecemos o trabalho dos ex-alunos da Universidade Católica de Temuco que participaram da pesquisa: Víctor Garrido, Damaris Parada, Nathalie Jaramillo e Nicol Cereceda.

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