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Petro, vitórias prematuras e nuvens escuras no horizonte

Há muitas dúvidas sobre a capacidade que o governo da Colômbia terá de implementar reformas dispendiosas

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Jaime Tenjo G.

Economista e consultor de organizações nacionais e internacionais

O novo governo da Colômbia, do presidente Gustavo Petro, de tendência centro-esquerda, tenta desenvolver uma agenda muito ampla, mas enfrenta múltiplos problemas.

Em suas primeiras semanas, conseguiu construir uma coalizão ampla no Congresso, consolidando uma maioria que neste momento lhe garante a aprovação dos projetos de lei apresentados. Entretanto não se sabe quão sólida é essa coalizão e quão capaz ela é de sobreviver ao debate sobre propostas difíceis.

A primeira prova de fogo enfrentada é a reforma tributária que visa arrecadar aproximadamente US$ 4,5 trilhões, e para isso foram estabelecidos quatro objetivos.

Em primeiro lugar, procura eliminar ou reduzir uma longa lista de privilégios tributários que tornam a taxa efetiva de tributação muito menor do que a nominal.

Por outro lado, procura aumentar a progressividade dos impostos de maneira significativa, incluindo impostos sobre lucros ocasionais e dividendos corporativos (pelos quais foi acusado de introduzir dupla tributação) e tornando os royalties das operações de mineração (especialmente o petróleo) não dedutíveis dos lucros para fins de liquidação do imposto corporativo.

Além disso, procura-se estabelecer sobretaxas fiscais temporárias ao setor financeiro e aos altos preços internacionais dos produtos minerais (petróleo e carvão). E, por último, fortalecer o Dian (departamento de impostos) para reduzir a evasão de impostos.

A coalizão governamental conseguiu facilmente sua aprovação no primeiro debate, mas possivelmente, para conseguir a aprovação definitiva em novembro, terá que negociar alguns pontos com vários grupos políticos e com empresários que foram muito críticos à reforma.

Possivelmente o governo conseguirá levar a reforma adiante, mas as relações com o setor produtivo e financeiro serão afetadas. Se o novo estatuto tributário for aprovado sem ter que fazer demasiadas concessões, será uma grande mudança em relação ao que tradicionalmente se havia alcançado na Colômbia.

Vestindo terno e gravata, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, fala e gesticula com a mão direita durante reunião na sede da Presidência, em Bogotá
O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, durante reunião sobre questões de segurança, comércio e mudanças climáticas na sede da Presidência, em Bogotá - Luisa Gonzalez - 3.out.2022/Reuters

Um segundo propósito prioritário do governo de Petro é a implementação do acordo de paz. Esse projeto, que recebeu prioridade muito baixa por parte do governo anterior, é outro assunto de difícil manejo.

Requer fundamentalmente uma reforma agrária integral que provavelmente será custosa (por essa e outras razões, a reforma tributária é tão necessária). Houve várias tentativas fracassadas de implementar tais reformas na Colômbia, o que, segundo alguns, contribuiu para criar um clima propício ao desenvolvimento de movimentos guerrilheiros.

Tradicionalmente, a indústria pecuária tem sido radicalmente oposta a esse tipo de reforma.

Entretanto, na semana passada, a Fedegan (Federação Nacional de Criadores) assinou um acordo com o Petro e a ministra da Agricultura, Cecilia López Montaño, comprometendo-se a vender 3 milhões de hectares de terras produtivas ao governo para que este implemente os programas de reforma agrária integral.

O plano de governo inclui o fornecimento de terras às populações indígenas e afrodescendentes e aos camponeses pobres, dentro de um marco que inclui assistência técnica, creditícia e de fornecimento de bens públicos.

Apesar desses e de outros significativos êxitos iniciais do governo, também há nuvens escuras no horizonte. Falta clareza sobre o conteúdo de outra série de reformas propostas.

Por exemplo, uma das promessas era a reforma do sistema de saúde, mas ainda não se conhece um projeto de lei de reforma.

A ministra da Saúde, Carolina Corcho, falou de reformar as EPS (Entidades Prestadoras de Saúde), em sua maioria privadas, que constituem o elemento básico do sistema, recebendo os recursos do governo para fornecer os serviços de saúde à população.

Uma série de suposições foi tecida em torno dessa reforma, ainda não esclarecidas pelo governo e que geraram temor em certos setores.

É importante mencionar que, embora o sistema de saúde tenha muitos problemas, em comparação com outros serviços de países da região sempre foi classificado como um dos melhores.

Incerteza similar existe com relação a uma prometida reforma trabalhista cujos elementos básicos também não foram esclarecidos.

O mesmo se aplica à reforma previdenciária que o presidente (e outros candidatos) mencionaram durante a campanha.

Segundo Petro, o objetivo é garantir a todo colombiano maior de 65 anos uma pensão mínima de meio salário mínimo (pouco mais de US$ 110 por mês na taxa de câmbio atual).

Isso claramente criou muitas expectativas que, se não forem cumpridas, podem se tornar uma grande responsabilidade política para o governo durante seus últimos anos.

Em termos de política energética, as declarações do presidente e de alguns ministros foram contraditórias. O objetivo é "descarbonizar a economia", mudando para energia limpa, mas não está claro como isso deve ser feito.

Tem-se falado em acabar ou limitar a exploração de petróleo e gás, mas existe o perigo de, a longo prazo, o país acabar importando esses recursos ao não conseguir desenvolver com suficiente rapidez fontes limpas de energia.

O ministro da Fazenda da Colômbia, José Antonio Ocampo, de terno azul marinho, camisa branca e gravata azul clara, gesticula com a mão direita durante entrevista à agência de notícias Reuters, em Bogotá
O ministro da Fazenda da Colômbia, José Antonio Ocampo, concede entrevista à agência de notícias Reuters, em Bogotá - Vanessa Jimenez - 2.ago.2022/Reuters

Além disso, as exportações de petróleo, de longe a principal fonte de divisas, teriam que ser sacrificadas. O ministro da Fazenda, José Antonio Ocampo, negou que haja planos para limitar a exploração de petróleo.

Finalmente, o contexto econômico nacional e mundial limitam de maneira importante a capacidade de manobra do governo.

A inflação alta, que na Colômbia está em níveis acima de 11% ao ano, forçou o banco central a aumentar as taxas de juros, o que certamente terá impactos sobre o crescimento econômico.

Embora as taxas de crescimento do PIB tenham sido relativamente altas em 2022, prevê-se uma queda significativa para o próximo ano, e alguns estão falando sobre a possibilidade de uma recessão.

Dentro desse preocupante marco econômico, surgem muitas dúvidas sobre a capacidade que o governo terá de implementar as dispendiosas reformas que propôs.

A reforma tributária é um ponto importante a favor, mas não é suficiente.

Tradução de Giulia Gaspar

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