Laura Carvalho

Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".

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Laura Carvalho

Krugman acerta mais do que erra em diagnóstico da crise

Entre as causas, Nobel não cita intervencionismo nem irresponsabilidade fiscal de Dilma

Em artigo publicado em seu blog no jornal New York Times na sexta-feira (9), Paul Krugman arriscou algumas explicações para a crise econômica brasileira que destoam significativamente das que vêm dominando o debate econômico no país nos últimos anos. 

Paul Krugman, Prêmio Nobel de Economia
Paul Krugman, Prêmio Nobel de Economia - Zanone Fraissat - 16.set.12/Folhapress

Entre as causas elencadas pelo vencedor do Nobel, não compareceram, por exemplo, o excesso de intervencionismo do Estado brasileiro desde a crise de 2008-09 ou a irresponsabilidade fiscal do governo Dilma Rousseff.

Segundo Krugman, a recessão teria sido causada por uma combinação de má sorte e má política. De um lado, o fim do superciclo das commodities e a consequente perda de valor das exportações brasileiras desde 2011 já seriam suficientes para desacelerar a economia.

O impacto do choque externo sobre o consumo das famílias teria sido agravado pelo aumento do endividamento do ciclo anterior.

Já do lado da má política, Krugman dá destaque para o que considera uma resposta totalmente equivocada a tais choques: o corte substancial de gastos públicos em 2015 e a elevação da taxa de juros desde 2013, que teriam aprofundado a recessão.

Em artigo intitulado “Bad luck or bad policy: uma investigação das causas do fraco crescimento da economia brasileira nos últimos anos”, publicado em meados de 2016 —e atualizado no blog do Ibre/FGV em 2017—, o economista Bráulio Borges já havia concluído, a partir da comparação com um grupo de países exportadores líquidos de commodities, que ao menos 38% da desaceleração do PIB per capita brasileiro entre 2012 e 2017 teria sido causada por fatores internacionais.

Mas nem todo o restante é fruto de “bad policy”, pois, como aponta Bráulio, a economia brasileira também sofreu alguns choques internos no período: a crise hídrico-energética de 2013-2015 e os impactos de curto prazo da Lava Jato. Se aceitarmos as estimativas de Bráulio, restam menos de 40% da crise para explicar por erros de política econômica. Mas quais seriam eles? 

Diversos estudos convergem em atribuir aos investimentos públicos um alto multiplicador fiscal sobre a renda nacional: cada R$ 1 investido eleva a renda em cerca de R$ 1,5.

Os investimentos federais, que cresciam a mais de 20% ao ano no período 2006-2010, avançam menos de 1% anuais entre 2011 e 2014 e caem mais de 35% em 2015.

Os erros de política não começaram, portanto, no segundo mandato de Dilma: a resposta à desaceleração da economia, causada inicialmente por choques externos e internos, foi conceder valores cada vez mais altos em desonerações de impostos e expandir o crédito de bancos públicos, em vez de investir diretamente em infraestrutura, por exemplo. 

Sem perspectiva de retomada do dinamismo do mercado interno, investidores e consumidores endividados passaram a cortar seus gastos, contribuindo para aprofundar a crise e a perda de arrecadação.

Além disso, o represamento de tarifas energéticas e outros preços administrados para controlar a inflação —que acelerava pela desvalorização do real em meio ao choque externo— acabou sendo sucedido por um reajuste brusco nesses preços, que responderam por 38% da inflação de 2015, segundo relatório do Banco Central. 

Subir tanto os juros em meio a esse quadro foi um erro grave, mas represar os preços também se mostrou má ideia.

Ao observar o país de fora, Krugman pode ter omitido esses e outros aspectos importantes, mas acertou mais em seu diagnóstico do que os analistas econômicos contaminados pela polarização política.

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