Laura Carvalho

Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".

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Maior benefício de aprovar a Previdência seria tirar tema do centro do debate econômico

Quem sabe assim se abrisse algum espaço para que se discuta uma agenda para a retomada

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“Acho que a questão mais importante para o país é a Previdência. Isso não quer dizer que tentativas golpistas não sejam importantes”, afirmou a presidente Dilma Rousseff em café da manhã com jornalistas no Palácio do Planalto em 15 de janeiro de 2016, após o primeiro ano de forte recessão na economia.

Os parlamentares discordaram: era mais importante derrubar a presidente eleita. 

Mas, após mais de três anos de crise econômica, política e institucional, a Previdência continua insistindo em tomar o lugar do crescimento e do emprego no centro do debate nacional. 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, debate a reforma da Previdência em sessão da CCJ, na Câmara
O ministro da Economia, Paulo Guedes, debate a reforma da Previdência em sessão da CCJ, na Câmara - Pedro Ladeira - 3.abr.19/Folhapress

Em dezembro de 2016, mês em que foi aprovada a PEC do teto de gastos, Michel Temer enviou sua primeira proposta de reforma ao Congresso. Para além da impopularidade das medidas, que impactavam excessivamente os mais pobres, a perda de capital político após o Joesley Day exigiu uma revisão significativa do texto. 

Na nova versão, divulgada um ano depois, o tempo mínimo de contribuição passou a ser de 15 anos (em vez dos 25 anos exigidos no primeiro texto); a idade mínima tornou-se de 62 anos para mulheres e 65 para homens (em vez de 65 para ambos), e abriu-se mão de qualquer alteração no BPC (Benefício de Prestação Continuada) e na aposentadoria rural. 

Obviamente, as mudanças no texto —para muito melhor, diga-se de passagem— não foram suficientes para angariar o apoio dos parlamentares em pleno ano eleitoral. 

Ignorando, como sempre, as evidências do passado, o governo Bolsonaro propõe então um texto novo, que, além de incluir mudanças muito mais draconianas no BPC, volta a elevar o tempo mínimo de contribuição —para 20 anos— e dá o pontapé inicial para a migração para um sistema de capitalização que passaria a ser obrigatório para quem adere (em vez de complementar), minando as próprias bases de financiamento da previdência pública redistributiva.

Caso o objetivo fosse realmente aprovar a reforma, a estratégia não seria das mais inteligentes. Tanto que alguns analistas já preveem que o Congresso voltará a analisar a segunda versão da reforma de Temer —o que, é até duro dizer, seria um grande avanço.

Mas o que talvez seja mais danoso nos últimos três anos de debate sobre a Previdência é o peso absolutamente descabido que o tema foi ganhando na explicação da própria crise econômica e da estagnação que se seguiu. 

Embora os dois eventos tenham coincidido no tempo, o desemprego não está alto em razão da não aprovação da reforma da Previdência. Ao contrário, os impactos de curto prazo de uma reforma podem até ser recessivos, na medida em que a redução dos benefícios afete negativamente o consumo, por exemplo.

Se bem-sucedida, a reforma cumpriria apenas o objetivo de reduzir o ritmo de crescimento das despesas previdenciárias ao longo do tempo —o que, dadas as enormes restrições impostas pelo teto de gastos, poderia reduzir também o ritmo em que o Orçamento tem sido cortado em outras áreas importantes.

Nesse contexto, o maior benefício de curto prazo da aprovação da reforma para o crescimento seria o de finalmente retirar o tema da Previdência do centro do debate econômico, quem sabe abrindo algum espaço para que se discuta uma agenda para a retomada. 

O problema é que, dada a desaceleração da economia global e a insuficiência crônica de demanda em que nos metemos, a saída do quadro atual exigiria um estímulo fiscal, monetário e creditício ao qual os adeptos do ultraliberalismo parecem alérgicos.

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