Laura Mattos

Jornalista e mestre pela USP, é autora de 'Herói Mutilado – Roque Santeiro e os Bastidores da Censura à TV na Ditadura'.

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Três polêmicas para você se meter em 2020

Na área da educação já podemos delimitar alguns temas-chave para o próximo ano

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A gestão Bolsonaro ainda deve nos brindar com outras tantas polêmicas, mas na área da educação já podemos delimitar alguns temas-chave para o próximo ano.

Um que vai dar o que falar é o método de alfabetizar crianças. A nova política de alfabetização, que o governo não explica como colocará em prática mas diz que chegará às salas de aula em 2020, estimula o método fônico.

É aquele das antigas, o do “vovô viu a uva”, que ensina a criança a associar os sons às letras, começa pelas vogais, depois vai formando sílabas, até chegar às palavras.

Foi deixado para trás pelo construtivismo, que se disseminou no Brasil por volta dos anos 1980, e alfabetiza as crianças a partir de suas referências, dando ênfase ao significado das palavras.

O processo parte da realidade do aluno, seu nome, objetos, suas observações, para então ensinar a ler e a escrever em cima do que faz sentido para ele.

Críticos de Bolsonaro dizem que o governo se interessa pelo método fônico por ser capaz de fazer as crianças aprenderem a ler mais rapidamente, o que pode melhorar os índices de educação do país, mas que não garante a habilidade de interpretação, de uma leitura crítica.

O presidente e seus adeptos associam o outro método à esquerda, especialmente a Paulo Freire, para quem a alfabetização deve ser base de uma conscientização que leva a transformações sociais, ou, resumindo a Bolsonaro, coisa de “energúmeno” comunista.

Apesar de muitas escolas mesclarem os métodos, equilibrando prós e contras, a oposição entre elas se acirrou a partir da guerra política.

Outro tema que ganhará força em 2020 é a reformulação do ensino médio. Até 2022, todas as escolas deverão ter ampliado a carga horária para uma média mínima de cinco horas por dia e ter os currículos divididos em cinco itinerários, que serão escolhidos pelos estudantes de acordo com seus interesses: linguagens; matemática; ciências humanas e sociais aplicadas ou formação técnica e profissional.

Isso já é lei, mas está em aberto de que forma serão reorganizadas as redes estaduais e como cada escola, tanto pública quanto privada, montará seus itinerários.

Inúmeras questões devem surgir; vejamos só cinco possibilidades:

1) Todas as escolas oferecerão os cinco itinerários?

2) Um colégio que tenha um perfil mais ligado às artes pode disponibilizar só o de linguagens?

3) E se um aluno escolher o de formação técnica e nenhuma escola próxima da sua casa tiver essa opção?

4) Quais disciplinas entram em cada itinerário?

5) E se um estudante optar pelo de matemática, mas se interessar também por assuntos que estejam em outros currículos, filosofia, por exemplo?

Nas redes estaduais, é essencial que os governos abram ao máximo o debate para a população, que deve estar atenta para as oportunidades de participar –em São Paulo, a secretaria de Educação promete colocar em consulta pública uma minuta com os novos currículos.

Cada colégio também deve funcionar como arena de discussão, dando voz a alunos, famílias, professores, a qualquer pessoa que se interesse.

Na rede privada, ainda que as famílias possam escolher a escola com a proposta que lhes pareça melhor, é preciso superar a relação de consumo e engajar a comunidade nas mudanças. Educação, afinal, é isso, mais do que o valor das mensalidades.

Por fim, a censura infelizmente deve seguir como protagonista no Brasil de 2020, e, na educação, o ano começa com o prometido disque-denúncia.

A ministra Damares Alves (da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos), dona da ideia ao lado de Abraham Weintraub (Educação), anunciou que, além de servir para denunciar professores que atentem contra “a moral, a religião e a ética da família”, pode ser utilizado para delatar pais que não acompanhem a vida escolar dos filhos.

O que dizer de uma iniciativa que, além de institucionalizar a censura e reforçar a autocensura nas salas de aula, coloca como inimigos aqueles que deveriam ser parceiros no processo de aprendizagem?

Feliz Natal, sem esses temas na ceia da família. E bom senso para todos em 2020.

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