Leandro Narloch

Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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Tribalismo explica por que alguns não tomam vacina e outros admiram Paulo Freire

Enquanto a direita reacionária requenta o nacionalismo, a esquerda identitária revive uma das teorias marxistas mais fracas do século 20

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Por que diabos Jair Bolsonaro ainda não tomou a vacina? O leitor deve ter visto o papelão do presidente em Nova York. Boris Johnson disse contente que tomou duas doses da AstraZeneca; “ãhn... eu ainda não tomei”, respondeu o presidente brasileiro com um jeitão envergonhado que lembrou Seu Madruga, de “Chaves”.

Se a questão não estivesse politizada, Bolsonaro tomaria a vacina. Deve ter vacinado os filhos quando pequenos, deve ter se imunizado contra o coronavírus às escondidas. Só há um motivo para ele dizer que não se vacinou: seus opositores adoram a vacinação. Tiram fotos irritantes exibindo seus braços moles e o sádico slogan “Viva o SUS”. Por pura birra, só para irritá-los, Bolsonaro decide desdenhar a vacina contra Covid.

Costumamos achar que as pessoas tomam decisões estúpidas ou admiram picaretas por falta de informação ou baixo nível educacional. Há outro motivo: o comportamento de torcida. O desejo tribal de irritar inimigos imaginários, de jogar bombas na trincheira ideológica adversária —eis uma grande origem de equívocos.

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o premiê do Reino Unido, Boris Johnson, durante reunião em Nova York
O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o premiê do Reino Unido, Boris Johnson, durante reunião em Nova York - Michael M. Santiago - 20.set.21/AFP

Outro exemplo desse comportamento são as recentes homenagens a Paulo Freire. Li “Pedagogia do Oprimido” quando ainda era de esquerda, há uns 20 anos —e já naquela época me pareceu um marxismo simplório e empoeirado. Freire mistura platitudes bonitas sobre a importância da educação com malabarismos para relativizar a barbárie revolucionária. Como este:

“Inauguram a violência os que oprimem, os que exploram, os que não se reconhecem nos outros; não os oprimidos, os explorados, os que não são reconhecidos pelos que os oprimem como outro. (...) Na verdade, porém, por paradoxal que possa parecer, na resposta dos oprimidos à violência dos opressores é que vamos encontrar o gesto de amor. Consciente ou inconscientemente, o ato de rebelião dos oprimidos, que é sempre tão ou quase tão violento quanto a violência que os cria, este ato dos oprimidos, sim, pode inaugurar o amor".

O fato de Paulo Freire ser muito citado no exterior não é motivo de orgulho, mas de constrangimento para o Brasil. Semanas atrás, a revista The Economist deu uma capa sobre a “ameaça da esquerda autoritária” visível principalmente nas universidades americanas. Qual a raiz ideológica da perseguição aos professores que discordam de ativistas? Segundo a revista, “textos obscurantistas” de Herbert Marcuse e Paulo Freire.

O objetivo do pedagogo brasileiro de transformar alunos em militantes, uma espécie de maoísmo aplicado à educação, ajudou a transformar faculdades de humanas mundo afora em igrejas da Justiça Social, cujos professores (sacerdotes) mal sabem a diferença entre educação e doutrinação. Sua ótica de luta de classes reforça o coletivismo punitivo, a ideia de que as pessoas devem ser tratadas não como indivíduos, mas de acordo com o grupo a que pertencem.

Só um motivo para defender Paulo Freire: ele é o terror da direita. Basta dizer o seu nome para tirar antipetistas do sério. Por isso, só de birra, e só para mostrar lealdade aos companheiros de torcida, tanta gente se apressa a homenagear o pedagogo nas redes socais.

Enquanto a direita reacionária requenta o nacionalismo, a esquerda identitária revive uma das teorias marxistas mais fracas do século 20. São duas escolhas estúpidas que só o pensamento de trincheira consegue explicar.

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