Leandro Narloch

Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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A Lei da Ficha Limpa foi um erro?

Processo contra Deltan Dallagnol mostra que lei anticorrupção está sendo usada para perseguição política

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Quase todos nós comemoramos a aprovação da Lei da Ficha Limpa, em 2010. Amparada por um projeto de iniciativa popular, a lei anticorrupção foi aprovada na Câmara por 388 votos a favor e apenas um contra (de um deputado que se confundiu na hora de apertar o botão).

Mas veja a situação hoje. Lula e Eduardo Cunha, condenados na Lava Jato por escândalos bilionários de corrupção, estão soltos e livres para concorrer, enquanto o ex-procurador Deltan Dallagnol pode ficar inelegível. Foi condenado esta semana pelo Tribunal de Contas da União por ter "participado da concepção do modelo escolhido pela força-tarefa" em relação ao pagamento de diárias e passagens a procuradores.

O ex-procurador Deltan Dallagnol, que pode ficar inelegível - Evaristo Sa - 1º.set.20/AFP

Nunca ficou tão claro que a Lei da Ficha Limpa teve a consequência bastante nefasta de judicializar o processo eleitoral. Agora juízes podem decidir quem entra e quem fica de fora de uma eleição.

A lei deixou o processo eleitoral à mercê do ativismo judicial, do contorcionismo interpretativo, do privilégio a poderosos e outros males da Justiça brasileira.

Pior, a Ficha Limpa deu mais poder não só a juízes, mas ao Tribunal de Contas, órgão frequentemente considerado um antro de gastança, corrupção e politicagem.

O ministro Bruno Dantas, relator do processo no TCU contra a Lava Jato, foi indicado para o cargo por uma figura de reputação ilibadíssima como Renan Calheiros. Sua decisão pela condenação de Deltan, Rodrigo Janot e João Vicente Romão contrariou o parecer da área técnica do TCU.

É difícil evitar a sensação de que a lei da Ficha Limpa foi usada nesse caso como ferramenta de perseguição. E que o processo do TCU sequer existiria se não pudesse resultar em inelegibilidade.

Para piorar só mais um pouco, talvez a lei tenha ajudado a deteriorar o próprio Judiciário brasileiro. Se o poder político dos juízes aumenta, também aumenta a demanda para corrompê-los.

Em 2010, ainda achávamos que o Judiciário era um poder mais nobre que os outros, com superioridade moral suficiente para conter abusos do Legislativo e do Executivo.

Acreditávamos que interferências imparciais das cortes poderiam nos livrar de ervas daninhas do processo democrático. Cada vez mais percebemos que isso era uma ilusão.

Houve alertas na época. "Não possuir condenações não significa em absoluto que o sujeito não seja um bandido", escreveu o colega Hélio Schwartsman aqui na Folha. "Nosso sistema judicial é compatível com inúmeros adjetivos, mas não com termos como ‘eficiente’ ou ‘certeiro’, em especial quando lida com acusados poderosos."

De todos os defeitos do processo do TCU que condenou Deltan e Rodrigo Janot a devolver R$ 2,8 milhões gastos em diárias na Lava Jato, há um atenuante. O relator Bruno Dantas gastou, só nos últimos doze meses, R$ 547 mil com suas viagens "a trabalho" para França, Arábia Saudita, Áustria, Egito, Portugal e Estados Unidos, entre outros países. Quando o assunto é despesa com passagens e diárias de viagens, Bruno Dantas é especialista.

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