Leão Serva

Jornalista, foi coordenador de imprensa na Prefeitura de São Paulo (2005-2009). É coautor de "Como Viver em São Paulo sem Carro".

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Leão Serva

Acabar com o paisagismo autoritário

Você já teve a sensação de que as pessoas insistem em andar sempre pelos gramados?

Vista aérea do Parque do Povo, com o caminho usado pelos pedestres no meio do gramado
Vista aérea do Parque do Povo, com o caminho usado pelos pedestres no meio do gramado - Gabriel Cabral/Folhapress

Você já teve a sensação de que as pessoas insistem em passar sempre pelas mesmas rotas nos gramados das áreas verdes? Tanto que criam um “caminho de rato”, que impede a grama de crescer, em vez de andarem por roteiros pavimentados pelos paisagistas.

À primeira vista, parece falta de educação. Algumas autoridades até colocam plaquinhas que dizem: “Não pise na grama!”

Quando vemos de longe, como na foto do Parque do Povo, no Itaim Bibi, feita com um drone pela Folha, percebemos que o trajeto pisado é a menor distância entre dois pontos: os portões da área pública. 

Para quem não está flanando, apenas por distração, é a escolha mais lógica. O pedestre que decide atravessar o jardim, entre a estação da CPTM, a oeste, e o Shopping JK, a leste, levaria mais tempo se seguisse a trilha sinuosa imaginada por quem concebeu o parque. E, no dia a dia, a maioria das pessoas tem poucos minutos para chegar ao trabalho, almoçar ou voltar para casa.

Esse descasamento entre a vontade do povo e a do gestor público é muito comum em nossas cidades —chega a ser até uma metáfora do espírito autoritário estatal: jardins são implantados exatamente onde pedestres querem andar. E eles passam, mesmo que acabem por pisar a grama ou as plantas. 

O que era para ser verde vira um espaço de terra batida. Jardineiro e paisagista se frustram, sentindo que o belo foi destruído.

Qual seria o prejuízo estético se o processo fosse invertido: em vez de um roteiro concebido pela criatividade, pavimentássemos com pedras ou cimento exatamente o traçado que os usuários escolhessem? Porventura o gramado ficaria feio?

Foi o fotógrafo Tuca Reinés quem chamou a atenção do colunista para essa contradição entre a vontade de quem cria as áreas verdes e a de seus usuários. Formado em arquitetura e urbanismo, ele defende que, antes de implantar jardins em espaços públicos, os terrenos fiquem baldios por certo tempo. E depois, sejam fixadas as rotas eleitas pelos frequentadores.

Não parece uma boa ideia acabar com o paisagismo autoritário?

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