"O senhor fez exame para coronavírus?”, gritou um repórter na sala de imprensa lotada na Casa Branca, enquanto Donald Trump, nervoso, batia em retirada sem responder.
A batata quente caiu na mão do vice-presidente Mike Pence que, na segunda-feira (9) à noite, liderava mais uma entrevista coletiva da força tarefa federal de combate ao coronavírus.
Então, os jornalistas continuaram a insistir, "o presidente fez o exame? E o senhor?".
Pence disse que não havia feito teste de coronavírus e confessou não saber se Trump tinha sido examinado, horas depois de dois deputados republicanos que estiveram com ele e apertaram sua mão se colocarem em quarentena preventiva por terem tido contato com um paciente atingido pelo coronavírus.
Como o vice-presidente desconhecia informação tão básica, duas semanas depois de ter sido nomeado líder do combate nacional à epidemia?
Diante da repercussão da resposta de Pence, a Casa Branca divulgou uma nota dizendo que o presidente não fez o teste para o vírus porque não apresenta sintomas e não teve contato prolongado com os republicanos em quarentena, que àquela altura já eram cinco, inclusive seu novo chefe de gabinete, Mark Meadows.
As frequentes entrevistas coletivas de Pence sobre o surto têm se caracterizado por duas partes distintas.
Os briefings de médicos e epidemiologistas das diversas agências de saúde do governo federal, com informações sobre novos casos, prevenção, tratamento e anúncios do vice-presidente prefaciados por exaltações ao chefe mais apropriadas a subalternos de Kim Jong-un, na Coreia do Norte.
É evidente que os Estados Unidos desperdiçaram semanas preciosas, e o governo Trump resistiu a levar a sério a ameaça epidêmica anunciada na China, em dezembro de 2019.
O jornal The New York Times revelou que o secretário de Saúde, Alex Aznar, teve dificuldade, em janeiro passado, de concentrar a atenção do presidente sobre a epidemia. O foco na reeleição em novembro marcou a reação da Casa Branca.
Mike Pence planeja se candidatar à Presidência desde a eleição de Barack Obama, em 2008. Ele estava politicamente comatoso, em 2016, quando foi escolhido vice da chapa republicana.
Pence era governador de Indiana e tinha sido associado a uma explosão de infecções por HIV no estado, depois de reduzir financiamento a programas de saúde pública.
Quando se candidatava à reeleição, Pence foi resgatado por Paul Manafort, hoje um detento cumprindo pena de prisão por conspiração e fraude, então diretor da campanha de Trump.
A reação inicial de Pence, após a indicação para combater a epidemia do coronavírus, foi dizer que ia rezar mais.
Sua adesão tardia à chapa de Trump cabia num cenário já traçado. O plano original era adquirir um palanque nacional, perder a eleição de 2016 para Hillary Clinton e disputar a Presidência em 2020, com Trump devolvido à sua cobertura na Trump Tower.
Na madrugada de 9 de novembro de 2016, quando Hilllary telefonou para conceder sua derrota, Pence se curvou para beijar a mulher, Karen. E ela evitou o gesto, reagindo com “me deixe em paz, você conseguiu o que queria".
Tom LoBianco, autor de uma biografia de Pence, conclui que Karen Pence não estava com raiva de Donald Trump, alguém que não merece sua estima. Ela estava irritada com o marido.
Uma coisa era atrelar seu trem de conservadorismo evangélico a um homem que se gabava de “agarrar mulheres pela vagina” para justificar o avanço da candidatura a presidente.
Outra era transformar a relação de meses de campanha em quatro anos de governo. O plano fracassou.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.