Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães

Com malandragem nova-iorquina, Trump fatura a derrota nas urnas

Presidente arrecadou US$ 170 milhões desde eleição de 3 de novembro

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Um mês depois da eleição presidencial, a campanha republicana continua enriquecendo o candidato derrotado. Faz todo o sentido um presidente acidental, que se candidatou, em 2016, apenas para negociar melhores contratos para sua empresa, ter descoberto mais uma forma de separar incautos do próprio dinheiro.

Quem precisa abrir loja de chocolates para lavar rachadinhas quando a legislação de financiamento eleitoral oferece melhor retorno? Graças a ela, Donald Trump já arrecadou pelo menos US$ 170 milhões para seu novo empreendimento, não um condomínio na Flórida, mas uma fundação que poderia se chamar Fraude Participações.

Oficialmente, os emails e as mensagens de texto que bombardeiam diariamente os eleitores pedem doações para sustentar a batalha legal que visa reverter a vitória de Joe Biden em vários estados.

É uma farsa encenada por advogados de porta de delegacia repetidamente espinafrados por juízes furiosos com os erros primários em petições e denúncias sobre a apuração. Mas, pasmem, o dinheiro pode também financiar despesas pessoais dos beneficiários, sejam elas passagens de avião ou refeições.

Como carioca, desembarquei aqui com a ilusão de que os nova-iorquinos eram amadores da malandragem. Cresci esbarrando em pontos de bicho na esquina –“Sonhei com você e vou jogar no 9, é cobra”, avisou-me, certa vez, um microempresário zoológico– e hoje percebo que a dinastia do bicheiro Castor de Andrade não poderia engraxar os sapatos da dinastia Trump.

E vamos ser justos com o finado empresário que será tema da Unidos de Bangu, no Carnaval de 2021, com direito ao samba enredo “Deu Castor na Cabeça”: uma fração de sua fortuna, ao menos, foi aplicada nos desfiles da Mocidade Independente de Padre Miguel.

Os US$ 170 milhões que o presidente tomou de apoiadores não rendem nem um boné vermelho com a inscrição MAGA (abreviação do slogan, em inglês, “Faça a América grande de novo”). O dinheiro está sendo desviado para o novo e perfeitamente legal comitê de ação política aberto por Donald Trump, o Save America.

Sabe-se apenas de um doador rico que entrou com ação na Justiça do Texas para recuperar os US$ 2,5 milhões que investiu em outro comitê republicano para investigar a fraude eleitoral, tão real quanto a mula sem cabeça.

O uso ilimitado de fundos em campanhas políticas foi liberado pela Suprema Corte americana, em 2010, numa decisão que igualou as doações a “liberdade de expressão” e abriu as portas para o grande capital influenciar eleições sob a proteção de comitês de ação política.

Mas é importante notar que a maior parte do dinheiro arrecadado por Trump depois da eleição veio de pequenos doadores inconformados com a vitória de Biden, cuja vantagem chega a quase 7 milhões de votos.

No Rio, ouvi dos bicheiros da esquina a advertência: “Malandro demais se atrapalha”. Em Nova York, o empresário que aprendeu com o pai a tomar dinheiro do governo para subsidiar moradias que, em seguida, negava a inquilinos negros, desfruta de décadas de impunidade.

Resta saber se esse currículo de triunfos ainda pode ser interrompido. Afinal, o sábio carioca Paulinho da Viola advertiu outro malandro, num samba: o acaso não tem pressa.

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