Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães
Descrição de chapéu terrorismo 11 de setembro

Nos 20 anos do 11 de Setembro, EUA enfrentam resultado da guerra seletiva ao terror

Novo livro argumenta que essa resposta aos atentados tornou possível a Presidência de Donald Trump

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Às vésperas do 20º aniversário do 11 de Setembro, o arquiteto intelectual dos ataques está de volta a um tribunal. O julgamento de Khalid Sheikh Mohammed e outros quatro réus havia sido interrompido em março de 2020 por causa da pandemia de Covid-19 e foi retomado na terça (7).

A ironia foi, logo cedo, uma vítima da chamada guerra ao terror, como se vê pela placa ostentando o nome das instalações militares da prisão de Guantánamo, em Cuba, onde os réus são julgados: Campo Justiça. Mohammed e inúmeros outros acusados de terrorismo detidos em Guantánamo foram capturados sob o programa de “rendição extraordinária” (sequestro) e barbaramente torturados pela CIA em “black sites”, prisões clandestinas em que os detidos não tinham acesso a assistência jurídica.

Placa indicando o 'Camp Justice', ou campo justiça, na base americana de Guantánamo, em Cuba - Paul Handley - 7.set.21/AFP

Pelo Campo Justiça, também apelidado de “ilha fora da lei”, passaram 700 prisioneiros que acabaram deportados por quatro presidentes. A conclusão da ocupação americana do Afeganistão serviu de lembrança de que a luta começou viciada pelo nome. Não há nada ecumênico no combate ao terror, o que ficou claro na invasão do Capitólio em janeiro.

Terroristas brancos cristãos têm conseguido se agrupar e se armar com relativa impunidade, e esse combate seletivo ao terror pode ter facilitado o mais letal episódio de terrorismo doméstico no país, a explosão do prédio federal de Oklahoma City, que matou 168 pessoas em 1995.

Um novo livro argumenta que a guerra ao terror tornou possível a Presidência de Donald Trump. O autor de "Reign of Terror: How the 9/11 Era Destabilized America and Produced Trump" (reino do terror: como a era do 11/9 desestabilizou a América e produziu Trump) é Spencer Ackerman, jornalista especializado em segurança nacional. Ele analisa o papel das várias frentes da guerra —a invasão de dois países, a espionagem eletrônica em escala industrial e os abusos de direitos humanos no avanço do autoritarismo nos EUA.

A guerra ao terror não resultou em vitória ou paz, alega o autor. Ao dizer que o terrorismo no mundo se tornou uma metástase global, respondendo aos críticos da retirada do Afeganistão, Joe Biden parece admitir o fracasso na guerra ao terror iniciada por George W. Bush.

Spencer Ackerman acredita que a ultradireita nativista eleitora de Trump foi parcialmente forjada sob Bush, quando ele transformou a imigração em questão de segurança nacional, suprimindo a ideia dos imigrantes como novos americanos em formação.

Muçulmanos vivendo nos EUA, lembra Ackerman, viraram alvos indiscriminados de espionagem e perseguição. Ele afirma que a transformação não teria sido possível sem a cumplicidade e o endosso de democratas liberais, num país onde se tornou tabu contestar o establishment de inteligência e segurança nacional.

Numa tarde de maio de 1993, fui despachada, como repórter freelancer da agência Reuters, para entrevistar o xeque Omar Abdel-Rahman que vivia em Nova York. Abdel-Rahman era o clérigo radical muçulmano acusado de ordenar o primeiro ataque às torres gêmeas de Manhattan, em fevereiro daquele ano. Ele já havia sido preso antes no Egito, acusado de encomendar o assassinato do presidente Anuar Sadat, em 1981.

O xeque morreu em 2017, quando cumpria pena de prisão perpétua numa penitenciária americana. Hoje vejo como a minha reação visceral ao contato pessoal com o homem condenado por ordenar mais ataques de seu apartamento no Brooklyn foi explorada depois do 11 de Setembro.

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