Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Lúcia Guimarães

Occupy Wall Street faz 10 anos com apoiadores em desacordo sobre impacto do movimento

Desigualdade continuou crescendo, mas há quem veja frutos dos acampados na política e na sociedade

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Fracasso ou movimento duradouro? Nesta sexta-feira (17), Nova York vai marcar sem alarde o 10º aniversário da tarde em que mil pessoas ocuparam uma praça próxima a Wall Street, motivando uma onda de protestos que se espalhou por centenas de cidades em três continentes.

A inspiração veio dos protestos da Primavera Árabe, e o combustível de efeito retardado foi o mergulho na pior recessão desde a Grande Depressão, com o crash de 2008, quando o governo socorreu os bancos, mas não os milhões de americanos que perderam o teto e o emprego.

O acampamento durou dois meses e foi dissolvido a cassetete e gás lacrimogêneo pela polícia. O movimento que não tinha líderes ou plataforma definida, além do combate à desigualdade, não resistiu à expulsão da praça.

Manifestantes do movimento Occupy Wall Street em marcha em Nova York em 2011 - Brendan McDermid - 28.set.11/Reuters

O redator do email original de convocação para a manifestação em Wall Street, Micah White, diz que, apesar de ter sido importante, o Occupy não atingiu metas a longo prazo. De fato, a desigualdade de renda continuou crescendo nos EUA. Nenhuma legislação para reinar sobre a especulação financeira foi implementada. Os bilionários do mundo ficaram 54% mais ricos durante a pandemia.

Por outro lado, os EUA não teriam os progressistas Bernie Sanders e Elizabeth Warren como candidatos viáveis a presidente sem a propagação de ideias como “nós somos os 99%”. Uma reivindicação deixou de ser tabu: o salário mínimo de US$ 15 por hora se espalhou pelo funcionalismo de cidades, estados e vai sendo adotado por corporações como a Amazon.

O vice-presidente centrista que testemunhou os protestos se tornou o presidente responsável por uma agenda social que já reduziu à metade a pobreza infantil no país. A crise de endividamento dos estudantes universitários entrou na pauta em Washington, e Biden já perdoou US$ 1,9 bilhão em dívidas.

Se o jornalismo é o primeiro rascunho da história, a mídia americana, de maneira geral, mereceu nota baixa naquele setembro de 2011. A cena extraordinária do acampamento foi ignorada, nos primeiros dias, uma desatenção improvável se a praça tivesse sido ocupada pelo movimento conservador Tea Party.

A imagem da multidão de aparência hippie, dormindo em tendas de plástico, cantando e batendo tambores foi um prato cheio para sarcásticos de plantão que ridicularizavam os jovens nos menores detalhes. Mas, quando passeatas promovidas no mês seguinte pelo Occupy foram violentamente reprimidas pela polícia, com centenas de prisões, os ventos mudaram. Políticos, artistas e celebridades começaram a se atropelar para fazer discursos na praça.

Sim, não faltou comicidade. Sob o mantra da descentralização, o grupo deliberava horas a fio sobre decisões prosaicas como "onde colocar as latas de lixo reciclável?".

Há fundadores do acampamento que defendem seu legado e veem grande valor em ter mostrado que é possível iniciar ativismo orgânico do nada. Acreditam que o Black Lives Matter é filho do Occupy.

A mídia via na teatralidade das manifestações um artifício para compensar o vácuo de ideias. Mas quem se elegeu presidente descendo uma escada rolante e inventando crises e inimigos? Quem continua presidente passeando a cavalo em Brasília e encenando um frenesi golpista diário?

Trump e Bolsonaro não passam de performance e indignação fabricada com mentiras sobre costumes, armas, falsa religiosidade. E nenhum dos dois teria coragem de dormir no sereno por dois meses.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.