Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães

Novo inverno de pandemia se anuncia no hemisfério Norte

Resistência a medidas que salvam vidas e podem restaurar a economia é abastecida pelo descaso sobre a morte

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Principal feriado nos Estados Unidos, o Dia de Ação de Graças, nesta quinta-feira (25) vai concentrar o maior número de americanos em trânsito desde o começo da quarentena de março de 2020. Só as companhias aéreas esperam um movimento de 20 milhões de passageiros. Famílias de vacinados e não vacinados vão se aglomerar para comer peru e celebrar a suposta refeição dos peregrinos que colonizaram o país no século 17.

Sinal de confiança de que a pandemia foi derrotada? Não. Os índices de infecção voltaram a subir no país —30% em duas semanas. Embora a demografia da Covid seja desigual, determinada pelas regiões em que prevalecem negacionistas da vacina, a curva é ascendente.

A explosão de casos na Europa, intensificada pela variante delta, e a recusa de americanos, nadando nas doses de vacina, em se imunizar sinalizam mais um inverno de pandemia. É impossível dissociar o contexto político, as guerras culturais sobre máscaras e distanciamento social da sabotagem do combate à Covid-19.

Manifestantes durante protesto anti-passaporte sanitário e em defesa da "Liberdade Global", em Nova York
Manifestantes durante protesto anti-passaporte sanitário e em defesa da "Liberdade Global", em Nova York - Yuki Iwamura - 20.nov.21/ AFP

Nova York deveria ser a cidade-pôster no outono (do hemisfério Norte) da volta ao normal. Mas só 68% da população elegível foi vacinada com duas doses. No momento, a Covid, como a influenza, parece teimar em se impor como sazonal, a exemplo da gripe. O número de infecções na cidade, onde o reforço vacinal é recomendado para toda a população adulta, está subindo.

Críticos das autoridades sanitárias federais começam a dizer que a "terceira dose de reforço" devia ter sido obrigatória há meses. A reabertura de eventos, os espetáculos ao vivo e a permissão de entrada de viajantes de países como o Brasil, que faziam parte da lista de restrições, vão alimentar uma onda de infecções em NY? A resposta deve ser sim; o índice local de infecções aqui é agora o mais alto desde abril, quando a população vacinada era muito menor.

A resistência à vacina e a medidas de distanciamento social, como o uso de máscaras, se espalhou e se tornou bandeira de sindicatos de empregados de atividades como saúde e educação em Nova York.

É difícil imaginar o combate a epidemias do século 20, como varíola e poliomielite, sob o clima atual de militância que confunde liberdade individual com direito de contaminar pessoas vulneráveis.

A nova onda da pandemia no hemisfério Norte coincide com a constatação de que a democracia, nos EUA e em dezenas de países, está em retrocesso. Obscurantismo e desconfiança em relação à ciência não são produtos do século 21. A Revolta da Vacina no Rio de Janeiro, em 1904, não foi motivada apenas pela imunização contra a varíola, mas contra reformas urbanas.

A diferença, em 2021, no ativismo antivacina que testemunhamos na Europa e nos EUA é que a resistência a medidas que salvam vidas e podem restaurar a economia de países devastados pela pandemia é abastecida por um niilismo assustador, um descaso sobre a morte.

A ideia de que qualquer medida obrigatória (como a exigência de vacina para entrar em locais públicos) constitui uma afronta à liberdade individual é um cavalo de Troia para democracias ocidentais. Quer opressão maior do que viver à mercê de cidadãos que acreditam ter o poder de arriscar sua vida?

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