Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães
Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Nova diáspora russa pode repetir tradição de perseguir exilados

Estima-se que 200 mil pessoas tenham deixado o país em 5 semanas de guerra na Ucrânia

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A longa mesa usada por Vladimir Putin ilustra mais do que seu notório pavor de contrair Covid. Se forem corretos os dados de inteligência passados a repórteres em Washington nesta quarta-feira (30), o isolamento do ditador inclui detalhes cruciais sobre o Exército que ele mandou para a Ucrânia.

Há uma tensão crescente entre o Kremlin e o comando militar causada pelas enormes perdas russas no campo de batalha e a resistência oferecida pelos ucranianos. De acordo com o briefing oferecido por uma fonte do governo Biden, Putin nem sabia que seu ministro da Defesa, Serguei Choigu, havia despachado um grande número de recrutas mal treinados para morrer na Ucrânia.

Maria Borzunova e Nigina Beroeva, jornalistas do canal independente russo TV Rain, despedem-se de um amigo, antes de partir para a Geórgia, sob medo de serem perseguidas pelo Kremlin
Maria Borzunova e Nigina Beroeva, jornalistas do canal independente russo TV Rain, despedem-se de um amigo, antes de partir para a Geórgia, sob medo de serem perseguidas pelo Kremlin - 6.mar.22 / The New York Times

A ignorância de Putin se estenderia também ao real estrago provocado na economia russa pelas sanções econômicas impostas no primeiro mês de guerra. "Seus assessores têm medo de dizer a verdade," disse a fonte.

Numa entrevista a um grupo de jornalistas independentes russos, o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, revelou um detalhe que parece confirmar a desinformação de Putin: soldados ucranianos encontraram uniformes de solenidade dentro dos primeiros tanques russos capturados, num aparente sinal de que o czar carniceiro contava com uma parada militar para comemorar uma rápida vitória.

Desde que as tropas russas começaram a se acumular na fronteira no final do ano passado, o governo Biden tem revelado detalhes de coleta de inteligência. É uma dança delicada que visa não comprometer as fontes em Moscou enquanto nega aos russos a vantagem do elemento surpresa, além de alugar um vasto espaço de desconfiança sobre lealdades na cabeça de Putin.

As atrocidades das tropas russas que começam a emergir não provocam surpresa em quem se informou sobre a devastação que elas deixaram em guerras na Tchetchênia e na Síria. Múltiplos relatos de estupros de mulheres ucranianas e de assassinatos em massa descobertos em áreas retomadas deveriam calar a boca de quem se refere à invasão da Ucrânia como um desfecho de erros expansionistas da Otan.

Mas, no caso da Rússia, não são só populações eleitas como inimigas por Moscou que têm algo a temer. Estima-se que 200 mil russos deixaram o país em cinco semanas de guerra. É uma sangria de cérebros extraordinária que deve prolongar os efeitos nefastos sobre a economia, quando as sanções forem suspensas.

Mesmo se Putin sair enfraquecido da guerra ou até deixar o Kremlin na horizontal, a Rússia tem uma sólida história de perseguição a exilados. Os exemplos mais recentes são os sucessivos assassinatos de dissidentes na Europa, mas a vítima mais célebre foi Leon Trótski, morto na Cidade do México por um comunista espanhol recrutado pela inteligência de Stálin, em 1940.

Putin, que se arvora a historiador, mas é intelectualmente medíocre, compartilha com a longa linha de tiranos russos de um terror a revoluções. Ele acredita que a Revolução Bolchevique de 1917 foi consumada por um pequeno grupo de exilados, financiados no exterior e que Lênin seria agente da Alemanha.

A nova diáspora interessa a Putin, a curto prazo, ao reduzir as fileiras de opositores nas populações urbanas bem-educadas. Mas não deve diminuir o apetite dos serviços de inteligência russos por monitorar, perseguir ou até matar exilados.

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