Lúcia Guimarães

É jornalista e vive em Nova York desde 1985. Foi correspondente da TV Globo, da TV Cultura e do canal GNT, além de colunista dos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo.

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Lúcia Guimarães
Descrição de chapéu Guerra da Ucrânia Rússia

Rumores sobre saúde, vazamentos e discórdia marcam a rotina de Putin na guerra

A cada nova aparição pública do líder russo a internet é tomada por especulações sobre o notório hipocondríaco

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Os paranoicos também têm inimigos. A imorredoura angústia persecutória de Vladimir Putin anda se justificando mais após a invasão da Ucrânia. Os militares estão furiosos com as baixas e a falta de tática.

Os siloviki, como são conhecidos os membros do aparato estatal de segurança de onde Putin emergiu, não param de vazar informações. E, a cada nova aparição pública, a internet é tomada por especulações sobre a saúde do notório hipocondríaco. Tremores nas mãos e passos hesitantes não podem ser avaliados por minutos de exposição, mas, neste mês, foi publicada uma reportagem investigativa que dá combustível ao rumor vastamente circulado entre a elite de Moscou: Putin estaria sofrendo de câncer.

O presidente russo, Vladimir Putin, discursa durante encontro com legisladores em São Petersburgo
O presidente russo, Vladimir Putin, discursa durante encontro com legisladores em São Petersburgo - Alexei Danichev/Kremlin via Reuters

O site Proekt Media, hoje editado do exílio por Roman Badanin, apurou que o presidente russo viajou dezenas de vezes acompanhado de um reforçado contingente de médicos para sua suntuosa residência em Sochi, à beira do mar Negro, entre 2016 e 2019.

O grupo incluía um cirurgião oncologista especializado em tireoide. A reportagem, da qual a grande maioria dos russos não tomou conhecimento, incomodou o bastante para merecer uma negativa do porta-voz do Kremlin numa troca de mensagens pelo Telegram com um jornalista russo. "Ficção e inverdade", afirmou Dmitri Peskov, sobre uma suposta cirurgia de Putin.

O desfile de imagens de tanques e material pesado destruídos pelos ucranianos que culminou com o ataque e o naufrágio do navio de guerra Moskva (Moscou, em russo) também não passa na TV russa, mas o blecaute de informação começa a ser rompido no entorno de Putin.

Uma dupla de repórteres russos exilados, talvez os jornalistas com mais contatos no establishment dos siloviki, mostrou-se surpresa com a súbita loquacidade de suas fontes, depois das semanas de silêncio no começo da invasão. Andrei Soldatov e Irina Borogan escrevem num artigo que seus telefones voltaram a receber chamadas e mensagens criptografadas de Moscou.

Os militares comunicam profunda insatisfação com a guinada de Putin, que, incapaz de ocupar Kiev, resolveu se contentar com a meta mais modesta de tomar novos territórios no Donbass. Os oficiais culpam a FSB, agência sucessora da KGB, pelo fiasco de inteligência sobre a resistência ucraniana.

Um blogueiro e conhecido veterano da temida força especial militar Spetsnaz publicou um vídeo inquirindo: "Caro Vladimir, por favor, decida se estamos lutando uma guerra ou nos masturbando".

Se a saúde de Putin é mais frágil do que admite o Kremlin, a intensa circulação do rumor palaciano pesaria no comportamento dos encarregados de cumprir ordens na Ucrânia. Afinal, o presidente que completa 70 anos em outubro e mudou a Constituição russa para ficar no poder até 2036 não tem sucessor aparente, e sua partida súbita poderia garantir um período de instabilidade com fartura de bodes expiatórios.

O jornalista búlgaro Christo Grozev, personagem central do novo documentário "Navalni", lembra a reação de um traficante de dados de quem comprou informações para identificar os agentes da FSB responsáveis por envenenar o líder da oposição russa com o agente Novichok.

"Pensei que você era só um criminoso, mas jornalista?", reclamou, desconsolado, o traficante. Entre os muitos erros de cálculo de Putin nessa guerra, um foi elementar. Na cleptocracia russa, tudo está à venda.

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