Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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"Altered Carbon", na Netflix, expõe fadiga com séries sci-fi

Adaptação de premiado romance de 2003 vira pastiche na Netflix

Luciana Coelho
São Paulo
Joel Kinnaman em cena de "Altered Carbon", da Netflix
Joel Kinnaman em cena de "Altered Carbon", da Netflix - Katie Yu / Divulgação

Podia ser um excelente filme, pois a trama de "Altered  Carbon" é de fato intrigante, com questões pertinentes sobre a obsessão humana por longevidade e um protagonista carismático. Como série de dez episódios que variam entre 40 e 60 minutos, porém, a produção que a Netflix estreou há uma semana não passa de um pastiche modorrento.

O thriller sobre o soldado convertido em investigador particular ressurreto Takeshi Kovacs nasceu sob a forma de livro, em 2003, escrito pelo britânico Richard Morgan.

Trata-se de um premiado romance policial sci-fi descendente direto do universo de Philip K. Dick ("Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?", que virou "Blade Runner") e William Gibson ("Neuromancer"), aqui editado pela Bertrand Brasil.

O título literal, "Carbono Alterado", evoca a mudança contínua de corpo pelas quais os seres humanos poderão passar no século 25 uma vez que seu organismo de turno morra. A consciência é preservada e armazenada em pastilhas e, depois, inserida em um novo corpo, chamado na obra de "capa".

Como a tecnologia não dá conta de mudar tudo, apenas os mais ricos conseguem patrocinar por mais de uma ou duas vezes essa constante reencarnação com vidas que valham a pena (os católicos, na expectativa pelo paraíso, também rejeitam a busca por um novo corpo).

Kovacs é um soldado de elite das Nações Unidas, aparentemente de origem japonesa (embora etnia e origem sejam conceitos difusos na obra), interpretado pelo ascendente Joel Kinnaman (o Holder de "The Killing" e também o "Robocop").

Após sua última morte, Kovacs reencarna no corpo de um policial caucasiano na região de San Francisco, EUA, graças ao patrocínio de um milionário excêntrico interessado em investigar a própria morte, Laurens Bancroft (James Purefoy, o Marco Antônio de "Roma", que ainda não aprendeu a atuar).

Não é o melhor papel de Kinnaman, ator competente cujo porte logo o alçou a galã (saudades de Holder). Mas ele tampouco chega a comprometer o personagem.

O problema em "Altered Carbon" é mais de roteiro e direção do que de concepção ou atuação.

Uma trama que já é complexa, suscitando até alguns minutos de questionamento filosófico, foi recheada com repetitivas sequências de luta e carnificina em geral que deixam de funcionar após os primeiros 60 minutos. O sexo na série tem função semelhante, usado em demasia para ocupar episódios, não para fazer a trama andar.

Aguardada com ansiedade pelos fãs do livro, "Altered Carbon" tem mostrado bom desempenho nas avaliações do público, embora a crítica a tenha recebido com decepção.

O cansaço com a produção resulta também de uma certa fadiga com o gênero e o excesso de futurismo soturno no ar --como se a vida real não estivesse caótica e sinistra o suficiente. De "Black Mirror" e "Westworld" à brasileira "3%", as distopias futuristas lotaram as grades de canais e plataformas de vídeo.

Para piorar, a transmutação de "Altered Carbon" de livro em série não mostra o vigor das demais.

Ainda que a trama guarde alguma graça, as cenas são previsíveis. O roteiro é preguiçoso. Em um mundo onde não há sobrevida, melhor usar essas dez horas em outra coisa.

"Altered Carbon" está disponível na Netflix

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