Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Luciana Coelho

'John Adams', da HBO, traz lições da democracia dos EUA

Séria mostra que só a habilidade política e a retórica unificadora fazem um estadista

Cena da série 'John Adams', da HBO - Kent Eanes/Divulgação

Neste momento em que ameaças à democracia em desavergonhado volume carregam o ar e perturbam o sono, faz bem recorrer a John Adams, um dos pais fundadores da democracia americana.

Adams (1735-1826) foi o segundo presidente dos EUA, sucessor do coronel George Washington. Embora não tenha recebido da história o mesmo louvor, o advogado e diplomata de Massachusetts pode ser entendido como o primeiro estadista da era moderna.

Sua trajetória está lindamente contada em "John Adams", produzida pela HBO em 2008 e que pode ser assistida hoje na HBO On Demand e na HBO Go (streaming).

Muito da excelência da produção, que tem sete episódios de cerca de uma hora, está em seu elenco principal.

No papel central está Paul Giamatti ("Billions", "Sideways"), possivelmente um dos mais entregues atores de sua geração. A seu lado, na pele da inseparável Abigail Adams —antes de haver Bill e Hillary Clinton havia John e Abigail Adams— vem a mesmerizante Laura Linney ("Ozark").

O sutil David Morse ("Dançando no Escuro") faz um ótimo George Washington (que nem queria ser presidente), e Stephen Dillani, o Stanis de "Game of Thrones", acerta no hesitante Thomas Jefferson.

A história da fundação dos EUA costuma ser edulcorada pelos americanos, que veem naqueles que promulgaram sua independência e depois sua Constituição —vigente até hoje— heróis ímpares.

Não é o caso na obra do diretor britânico Tom Hopper ("O Discurso do Rei"), que parte do livro do historiador best-seller David McCullough.

Na minissérie, "heróis" titubeiam e erram, mas justificam sua grandeza histórica porque mesmo sob guerra, pragas e inimigos, seu norte permanece a democracia (levado em conta, claro, o desajuste no conceito de democracia da época, em que mulheres não votavam e a escravidão vigorava).

Ao narrar a independência do ponto de vista de um diplomata/advogado, e não de um militar como quase sempre ocorre, Hopper e McCullough mostram que o bom combate, no fim, envolve mais do que truculência e voluntarismo.

Ao mostrar o dia a dia e as dúvidas de Adams, suas fraquezas, esclarecem que atalhos não funcionam e que a negociar muitas vezes é frustrante, mas só a habilidade política e a retórica unificadora fazem um estadista.

E que nenhum Estado, em regimes que prezam as liberdades civis e a prosperidade, pode estar acima de seu povo.

Adams, em suas muitas idas à Europa como diplomata, manteve correspondência frequente com Abigail. As cartas —que ajudam a conduzir a minissérie— trazem observações preciosas. Uma delas:

"Cidades podem ser reconstruídas, e um povo reduzido à pobreza pode voltar a ter bens. Mas se a Constituição de um governo for, em algum momento, afastada da liberdade, esta jamais será restaurada. A liberdade uma vez perdida estará perdida para sempre.

[...] Quando um povo abre mão de seu direito de defender as limitações do governo e de resistir a tudo que ao povo se sobreponha, ele jamais os recuperará."

“John Adams” está disponível na HBO Go

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