Já se vai um ano e meio que “Homecoming”, suspense da Amazon com forte inspiração na cartilha de Alfred Hitchcock e adaptado a partir de um podcast, estreou com Julia Roberts à frente. Nesta sexta, a segunda temporada, que tem como protagonista Janelle Monáe, chega às telas mais enxuta e com ritmo mais acelerado.
Trata-se de uma daquelas séries de “antologia”, um compilado de temporadas que tratam de um mesmo tema mas não necessariamente contam a mesma história (“Black Mirror”, “Fargo”, “True Detective” também são assim). Dá um alívio em ver que, diferentemente de outras produções que adotam o formato, “Homecoming” sai-se ainda melhor em seu segundo capítulo.
Em parte isso se deve a ter se aferroado com mais força à cartilha do diretor britânico que deu ao mundo obras primas como “Psicose” (1960), “Os Pássaros” (1963), “Um Corpo que Cai” (1958) e algumas dezenas de outras.
Desta vez, além da inspiração estética na fotografia, edição e trilha, e de manter-se no mesmo universo de personagens atordoados ou paranóicos, o diretor Sam Esmail (“Mr. Robot) e os corroteiristas Micah Bloomberg e Eli Horowitz, que pariram o podcast original, lançaram mão de ferramentas de roteiro consagradas por Hitchcock, como um macguffin —objeto desimportante que, após aparecer casualmente em cena, serve de alguma forma para mover a trama.
Ajudou, ainda, ter descolado um pouco do formato do podcast. A primeira temporada era muito calcada nos diálogos, e esta segunda, embora ainda os privilegie, usa melhor as imagens. Sete episódios também parecem ter se prestado melhor a contar essa história do que os dez da temporada inicial.
Finalmente, há dois novos trunfos, um de cada lado da tela.
Depois de ter deixado Walter Cruz (o ótimo Stephan James, indicado ao Globo de Ouro pelo papel), o coprotagonista da primeira temporada, sozinho em sua confusão mental, desta vez o espectador torna-se participante do jogo de suspeitas e aparência montado em torno da personagem Jackie, a nova protagonista desmemoriada, vivida por Monáe (um dos casos mais bem sucedidos de migração da música para a atuação).
O outro é um elenco perfeitamente cerzido. Se James e Roberts estavam bem acompanhados por nomes de peso como Bob Carnavale e Sissy Spacek na temporada de 2018, mas carregavam o enredo praticamente sozinhos, desta vez Monáe, ela mesma magnética, encontra pares que poderiam superá-la, mas se recolhem a uma incrível harmonia.
O melhor desses nomes é o da menos conhecida Hong Chau como a diligente Audrey Temple, recepcionista que salta à executiva da gigantesca empresa de cosméticos Geist, que, além de uma popular linha de produtos naturais de higiene, mantém um e outro negócio escuso com o Departamento de Defesa americano com a suposta missão de tornar a vida das pessoas mais leves, sem o peso dos mortos ou das memórias tristes.
Além dela, o próprio James volta à cena, e aparecem Chris Cooper (de “Adaptação” e “Adoráveis Mulheres”), como o empresário idealista Leonard Geist, e Joan Cusack (“Será que Ele É?)), sempre um conforto em cena, como uma oficial militar arrivista.
O enredo, com personagens mais nuançados, ainda gira em torno desses negócios escusos de uma grande corporação, mas ganha tons muito menos maniqueístas, jogando pro ar a dinâmica de mocinhos e bandidos e com isso absorvendo de supetão o espectador. É coisa pra ver num fôlego só e digerir nos dias seguintes.
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