A sensação após o primeiro episódio da nova "Council of Dads", que estreou quarta (12) na Fox, é uma certa tontura. Há, afinal, de tudo ali: doença, gravidez, parto, casamento, morte, início de relacionamento, revelações do passado. Depois dessa overdose, parece que pouco restará para os demais capítulos em termos de efeito dramático.
O fato de ter concentrado tantos acontecimentos no episódio-piloto, que joga na cara do espectador o que pode ser o efeito de um câncer grave na vida de um indivíduo e de uma família, porém, acaba liberando os roteiristas. Os principais clichês já estão ali, de uma vez, e a série pode abraçar abordagens mais sutis.
O tal "council of dads" é um conselho de pais montado por Scott Perry (Tom Everett Scott) para acompanhar seus filhos caso o câncer recém-descoberto em seus ossos se prove fatal.
Para a missão, são convocados o oncologista Oliver (J. August Richards), um homem gay que é o melhor amigo de sua mulher; o investidor durão Larry (Michael O'Neill), um dependente de álcool em recuperação; e o chef Anthony (Clive Standen, de "Vikings"), amigo de juventude de Scott.
À sua maneira, os três, inexperientes no assunto, terão de dar apoio à viúva, a obstetra Robin (Sarah Wayne Callies) e aos cinco filhos do casal, cujas idades variam de poucos meses a poucas décadas.
A série promete uma discussão sensível e atualizada da paternidade, e, embora só tenhamos o piloto, o registro açucarado ameaça transformar as boas intenções do roteirista em algo inverossímil. Nenhum problema com novelão, quando bem-feito, mas os roteiristas-chefes Joan Rater e Thony Phelan, egressos de "Grey's Anatomy", erram a mão.
Há algo importante, contudo, que Rater e Phelan trazem da escola de Shonda Rhimes: naturalizar a diversidade.
Os filhos de Scott e Robin têm origem distinta —a mais velha, Luly (Michele Weaver), é fruto de um relacionamento prévio dele, e é negra; a do meio, Charlotte (Thalia Tran) foi adotada e tem origem asiática; os três filhos biológicos do casal são o adolescente instável Theo (Emjay Anthony), a bebê Hope e JJ (Blue Chapman). JJ é o trunfo da série.
Apresentado na abertura como um típico menino de sete anos tentando superar o medo para se aventurar em um cipó, JJ é gordinho, sensível e introvertido. É preciso um punhado de cenas, e a intervenção de outra personagem que decide vesti-lo de menina, para que se perceba o que os roteiristas fizeram. JJ é uma criança transgênero.
Não uma menina em corpo de menino, como a cena habilmente faz o espectador supor, mas o oposto. E aí vem o estalo de que uma criança de sete anos, vestida, não tem nenhum marcador visual de gênero exceto os que impomos a ela. Não há nenhum discurso, e a cena é de uma sutileza sublime, com o contido JJ limitando-se a dizer para a avó que tudo bem, muita gente na geração dela não entende que não se trata de escolha.
Chapman, ator que interpreta JJ, é também um menino trans, como ocorre em séries americanas como "Billions" e "Sense8". A novidade é que, nos Estados Unidos, "Council of Dads" não passa em canal a cabo ou plataforma online, e sim no horário nobre em uma das três grandes emissoras abertas, a NBC. Não é pouca coisa.
Não se anime achando que é uma nova "This Is Us". Apesar da boa audiência, ela teve a segunda temporada cancelada.
‘Council of Dads’ vai ao ar às quartas, às 22h15, na FoxPremium1, e fica disponível no FoxPlay
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