Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Descrição de chapéu Maratona

Aposta do Amazon, 'Dom' mostra tragédia nacional de maneira pasteurizada

Série se inspira em caso verídico de garoto rico da zona sul carioca que virou ladrão

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"Dom", que o Amazon Prime Video lança nesta sexta-feira (4), é uma história de crime e também é, ou assim queria seu diretor, Breno Silveira, um mergulho nas intrincadas relações entre pai e filho.

Baseada no caso verídico de um moleque da zona sul carioca que entrou para o crime e foi morto às vésperas de completar 24 anos, em uma operação da polícia para prendê-lo, foi costurada a partir de dois livros com liberalidades da ficção —"Dom", de Tony Bellotto (2020), e "O Beijo da Bruxa", de Luiz Victor Lomba, o pai do protagonista (2011).

A teia apresentada é digna de tragédia grega.

Lomba, o pai, foi policial civil e integrou o infame Esquadrão da Morte, operação parapolicial de extermínio nos primórdios da guerra às drogas, e a contraposição entre seu caminho e o do filho são o motor dos episódios, que entremeiam a vida dos dois.

Mas "Dom" é mais vigorosa no primeiro aspecto, o do crime, do que no segundo, o da relação entre pai e filho, apesar dos ótimos desempenhos dos atores Gabriel Leone (Pedro) e Flávio Tolezani (Victor). E este é um de seus incômodos.

Apresentada como "baseada em fatos reais", nas mãos da produtora Conspiração a história emprestou notas da franquia de games GTA e da cinessérie "Velozes e Furiosos". Nenhum problema para quem gosta de ação.

A redução das personagens femininas a ladras hipersexualizadas ou parentes quase santas, contudo, é indigesta para o espectador que não é movido por testosterona.

Há, também, um tanto de condescendência com Pedro, quase um "bom ladrão" quando comparado ao exército de traficantes que povoa a tela —a família sempre acusou a polícia e a imprensa de extrapolarem seus crimes, em grande parte roubos de residências, somando a eles trabalhos de outras quadrilhas.

Pintado com tintas heroicas, o pai também perde o paradoxo que carregava na vida real, e a graça possível enquanto personagem.

Fora as sequências de ação, os melhores momentos da série dirigida por Breno Silveira são aqueles que mostram como a cor de pele pode servir de salvo-conduto ou apressar veredictos, nos julgamentos sumários que ocorrem a cada segundo no Brasil.

Recontar a chegada da cocaína ao país, em plena ditadura militar, nos anos 1970, e sua ascensão à droga da moda na década seguinte dá perfume histórico ao enredo, e é uma pena que a obra não tenha se dedicado mais tempo a essa reconstrução.

A série, com seus oito episódios, é a aposta brasileira do Amazon Video para o mercado internacional —deve encontrar sucesso— e um tento no campo que a Netflix tem dominado. Talvez por isso o roteiro deixe em segundo plano questões tipicamente brasileiras e acabe pasteurizado.

Recentemente, uma comédia social ("Pico da Neblina", da HBO) e um drama ("Onde Está Meu Coração", do Globoplay) abordaram o tema com mais nuances e sofisticação. "Dom" nem ao menos tenta buscar esse lugar.

Os oito episódios de 'Dom' estão disponíveis no Amazon Prime Video

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