Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Descrição de chapéu Maratona Séries

'WeCrashed', das séries de picaretas, é a que mais resume nossos tempos

Com Anne Hathaway e Jared Leto, obra é relevante por captar mudanças geracionais na forma de entender o trabalho

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A crítica e boa parte do público não morreram de amores por "WeCrashed", superprodução da Apple TV+ sobre a ascensão e a queda do casal empreendedor Adam e Rebekah Neumann que acabou ofuscada por uma onda de séries sobre picaretas. Vividos por Jared Leto e Anne Hathaway, os dois criaram, com um sócio, a WeWork.

Maior atenção seria recompensada. Embora não seja tão divertida como "Inventando Anna", tão espantosa quanto "O Golpista do Tinder" e tão escandalosa como "The Dropout", "WeCrashed" é, provavelmente, o melhor epítome dos nossos tempos entre elas.

Anne Hathaway e Jared Leto em cena da série "WeCrashed", do Apple TV+
Anne Hathaway e Jared Leto em cena da série "WeCrashed", do Apple TV+ - Divulgação

Os picaretas sob os holofotes aqui não forjaram a identidade (como a herdeira fake Anna Delvey e o sujeito do Tinder) nem venderam uma tecnologia inexistente, pondo em risco a saúde de milhões (caso de Elizabeth Holmes, retratada em "The Dropout"). Esses, segundo a Justiça, são criminosos.

Não. O negócio criado pelos Neumann e por Miguel McKelvey (vivido na série por Kyle Marvin) é legítimo e, embora mal administrado por Adam, hoje afastado, continua em pé.

Os investidores que injetaram bilhões na ideia do empreendedor israelense até então sem nenhuma experiência bem-sucedida sabiam de seu currículo e, exceto talvez por um e outro enfeite na proposta (chama "storytelling" agora, né?), não foram enganados quanto à empresa.

Mas a megalomania de Neumann e o eco que ela encontra em um tanto de pessoas hipnotizadas por histórias de dinheiro rápido sem grande trabalho o puseram em um processo de autocombustão que quase levou junto a start-up.

Leto, que se especializou em tipos excêntricos, interpreta um Neumann em perpétua e irritante animação. Anne Hathaway, como Rebekah, faz um trabalho mais sóbrio e igualmente impressionante.

Com uma boa ideia e muito papo, não raras vezes explorando as expertises da mulher e do sócio, Neumann passou em poucos anos de vendedor fracassado a bilionário dono de uma reluzente marca com escritórios por todo o globo.

Tudo embalado em um discurso vistoso de que a WeWork não oferece apenas espaços compartilhados para trabalhar e sim uma "comunidade", um "estilo de vida" e uma porção de outras expressões que a publicidade contemporânea nos martela. E haja drinques na firma, festivais pop no campo e um fluxo contínuo de trabalho e sexo, tudo misturado sem divisórias.

É isso que torna "WeCrashed" relevante: captar, como a empresa original buscou fazer, as mudanças geracionais na forma de entender o trabalho.

Neumann tropeçou ao espelhar na empresa seu sentimento de eterna adolescência, com salários baixos, farra sem fim, excessiva informalidade e nenhum limite entre pessoal e profissional. Encher os funcionários de comida e bebida, afinal, deixa de ser bacana se você está fazendo isso para mantê-los em infindáveis horas extras a custos baixos.

Para fazer seu negócio crescer mesmo sem pilares que o sustentassem senão a crença em seu modelo, arrecadou dinheiro e abriu filiais rápido demais, amarrando-se ao volúvel e complexo mercado imobiliário em diversas cidades ao mesmo tempo. Um monte de gente (gente muito rica, inclusive) embarcou com ele temendo perder o bonde do próximo Facebook ou Spotify.

Não é uma história trivial, é quase uma fábula. Os unicórnios --empresas novas que alcançam um valor de mercado de US$ 1 bilhão-- são, afinal, o eldorado, dos nossos tempos.

'WeCrashed' está disponível na AppleTV+ com novos episódios lançados às sextas

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