Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Descrição de chapéu Maratona Ásia

'Pachinko' trai fãs da saga literária original, mas ainda assim extasia

Opção da série por múltiplas linhas temporais prejudica composição dos personagens, mas enredo fisga de todo modo

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De cara sabia-se que seria tarefa descomunal transpor para as telas as mais de 500 páginas de "Pachinko", uma saga familiar minuciosa em sua devoção a detalhes históricos e às camadas de seus personagens. Mas o Apple TV+, que lançou a série no fim de março, tinha ouro na mão.

cena de série
Yu-na Jeon em cena da série 'Pachinko', do Apple TV+, adaptada do livro homônimo de Min Jin Lee - Divulgação

Publicado em 2017 (2020 no Brasil, pela Intrínseca), o livro consumiu dez anos da jornalista coreano-americana Min Jin Lee, que condensou numa escrita sóbria e delicada sua exaustiva pesquisa do calvário de famílias coreanas que migraram para o Japão na primeira metade do século 20.

Foi aclamada pela crítica, caiu no gosto do público e iluminou milhões a respeito de gente com a qual a história falhou —como diz uma personagem.

O que chega ao streaming em oito episódios —o sexto vai ao ar nesta sexta (15)— é um vislumbre do livro, no qual as nuances que Lee compôs foram pasteurizadas em algo grandiloquente e menos denso. Extasiante, é verdade.

A saga de Sunja, a menina que trocou os infortúnios da Coreia natal por provações piores no Japão sem nunca deixar de prover para sua família, é contada em múltiplas linhas temporais na série.

Com dezenas de personagens, episódios históricos, três línguas (coreano, japonês e inglês) e informações culturais e sociais pouco sabidas, o formato a prejudica.

A linearidade do livro serve melhor ao drama, que acompanha a protagonista de garota ignorante a matriarca indefectível (Yu-ma Jeon, Minha Kim e a oscarizada Youn Yuh-jung, de "Minari", a interpretam em diferentes fases). Nas mãos dos roteiristas, Sunja disputa protagonismo com o neto Solomon (Jin Ha), personagem cuja dimensão no livro vem de coroar a saga.

As idas e vindas de 1915 (e depois dos anos 1930 e 1940) para 1989 tampouco respeitam a apresentação e composição dos personagens. Mozasu (Soji Arai), o filho mais novo, é construído aos poucos no romance para espelhar toda uma geração de coreanos bem-sucedida porém desprezada no Japão, mesmo tendo nascido lá. Na primeira temporada da série —as lacunas indicam outras adiante— ele é quase um holograma, como Hansu (o astro Lee Min-Ho), o amante egoísta e cosmopolita da protagonista.

A heroína ganhou um voluntarismo de que Lee a privara, pois a criou persistente, insegura e por vezes passiva.

É natural em transposições do tipo que trechos inteiros sejam suprimidos; aqui, contudo, tirou-se parte da motivação dos personagens.

Ainda assim, ver "Pachinko" (o nome vem dos salões populares no Japão onde se joga um caça-níqueis cujas travas lembram pinball) nas telas inebria. A direção de arte e a fotografia são magníficas. Sunja revendo a praia da infância evoca o cinema do chinês Jia Zhangke. Mesmo desbastado o enredo nos fisga.

E o elenco merece ovação —sobretudo Minha Kim, que faz de sua estreia um assombro, e Youn Yuh-jung, um deleite com sua interpretação sutil e firme.

Em sua pretensão grandiosa, "Pachinko" às vezes falha. Nem por isso descumpre sua vocação: apresentar-nos uma vertente do racismo que no Ocidente mal conhecemos, mas cuja crueldade e consequências não fogem de seu absoluto, tão nefasto.

Pachinko

  • Quando Novos episódios às sextas
  • Onde Apple TV+
  • Classificação 16 anos
  • Elenco Soji Arai, Jin Ha, Minha Kim
  • Produção EUA, Canadá, Coreia do Sul, 2022
  • Direção Justin Chon e Kogonada

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