Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Luís Francisco Carvalho Filho

O clarão do futuro

A legitimação da censura permanece no horizonte

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O caráter autocrático da censura imposta por Alexandre de Moraes, apoiado em leitura enviesada do regimento interno do Supremo Tribunal Federal, faz lembrar, em dimensão reduzida, é claro, o sentimento do presidente Garrastazu Médici (1969-1974) em relação ao AI-5: “eu posso”; com ele nas mãos, “posso tudo”. A passagem é citada por Elio Gaspari em “A Ditadura Escancarada”.

Moraes foi desautorizado pelos mais antigos ministros do STF. Celso de Mello define censura como “perversão da ética do Direito” e Marco Aurélio fala em “mordaça”. O despacho de Alexandre de Moraes, além de inconstitucional, é estrategicamente desastroso: multiplica a exposição do que procura esconder.

Estátua representativa da Justiça em frente ao STF, em Brasília - Sergio Lima - 5.mai.2011/Folhapress

Justiça seja feita, Dias Toffoli, depois de nomeado para o Supremo, não tem sido tão “amigo do amigo do pai”. Sua vocação autocrática aparece em reportagem do Valor Econômico: diante de “inverdade”, tem que “ser tirado do ar”, “ponto”, “simples assim”.

Alexandre de Moraes não consertou um erro. Não há o que comemorar. A legitimação da censura, ainda que temporária, permanece no horizonte do país e será replicada em outros tribunais.

O que esperar do Supremo, depois da saída de Celso de Mello e de Marco Aurélio, em matéria de liberdade de expressão? Prevalece a herança da revogação da Lei de Imprensa em 2009, que proíbe censura em qualquer circunstância, inclusive a do Judiciário, e determina a submissão de agentes públicos e governantes ao direito de crítica e à liberdade de informação jornalística? Ou prevalece a pena autoritária revelada por Luiz Fux, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes?

Outro pensamento do ditador Médici ressurge esta semana na seção “Há 50 Anos” da Folha. Ao assumir o comando do 3º Exército, em Porto Alegre, meses antes de se tornar presidente da República, disse que “a democracia brasileira está abrindo o clarão do futuro”.

Cinquenta anos depois, o governo aposta em liberalismo econômico (com os sobressaltos do jeito Bolsonaro de ser), endurecimento repressivo e retrocesso moral.

Para a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a mulher deve ser submissa ao homem no casamento. O ministro da Justiça e Segurança Pública acode policial que mata. O ministro da Economia dá colher de chá para caminhoneiros e conversa com pai de jogador de futebol sobre suas pendências com a Receita.

 

Enquanto a oposição se desarticula pela falta de perspectiva, de credibilidade e de discurso, debatendo-se com pecados e demônios do passado recente, o Supremo Tribunal Federal parece um organismo adoecido.

A munição usada para matar Marielle Franco é parte de lote adquirido pela Polícia Federal. A Biblioteca Nacional e muitas instituições culturais não têm alvará de bombeiros. Eventos climáticos extremos prometem novas tragédias.

Está preso o ex-presidente Lula, o mais popular de todos, escolhido pela revista Time, em 2010, como o líder mais influente do mundo. Os ex-presidentes Temer, Dilma e Collor também são réus em causas criminais.

Jair Bolsonaro é escolhido como um dos mais influentes líderes da atualidade pela mesma revista, mas é chamado de “dangerous man” (homem perigoso) pelo prefeito de Nova York.

Com as recusas do Museu de História Natural e do Cipriani Hall em ceder seus espaços, a pretendida homenagem a Bolsonaro em Nova York pode se transferir para Nova Jersey, talvez para algum ambiente inspirado na “Família Soprano”.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.