Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Luís Francisco Carvalho Filho

Como ratos e baratas

Trump e Bolsonaro cultivam a metáfora da infestação

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O Departamento de Justiça dos EUA anunciou a retomada das execuções de condenados à morte na esfera federal.

Não era uma moratória formal, mas encerra-se um longo e saudável período de 16 anos de inatividade. A última execução foi em 2003 por crime cometido em 1995.

A pena capital está no ordenamento jurídico de 29 estados de um total de 50. Estima-se que mais da metade da população norte-americana ainda apoie, em tese, a sentença mais drástica que existe. Em 2020 haverá eleições presidenciais.

A equação é diabólica. A pena de morte incrementa o cacife político do candidato à reeleição. Além do discurso, Donald Trump tem oportunidade de mostrar os frutos da militância agressiva. Quer, aparentemente, modificar a curva do gráfico da pena de morte no século 21.

Desde 1999, marco histórico, quando foram executados 98 réus, até 2016, último ano da administração Barack Obama, com apenas 20 execuções, há uma vigorosa linha decrescente nas estatísticas da pena de morte, com um ou outro recuo ocasional.

Coincidência ou não, Trump toma posse em janeiro de 2017 e 23 execuções acontecem. Em 2018 seriam 25. A previsão para 2019 é crescente: dez execuções no primeiro semestre em cinco estados e 22 agendadas até o final do ano.

O presidente acaba de introduzir na grade geral de execuções, sempre sujeita a adiamentos e suspensões, o nome de cinco condenados pela Justiça federal com promessa de injeção letal para três deles em dezembro. O corredor da morte sob a jurisdição de Trump tem 61 habitantes.

Coincidência ou não, depois de um intervalo de tantos anos, o primeiro condenado federal a ser executado na América é da “supremacia branca”, valor sorrateiramente acalentado pela figura presidencial.

Com o gesto, Trump mostra o perfil de governante severo e, de olho no voto, tenta pincelar a imagem corroída pelo discurso do ódio —o que não o impede, registre-se, de semear permanentemente mensagens ofensivas e discriminatórias contra negros, mulheres, imigrantes, gays, muçulmanos, e de promover o comércio e a difusão do uso de armas.

Trump quer pena capital para autores de massacre e, em respeito ao sentimento dos familiares das vítimas, quer rapidez no desfecho dos casos: não se conforma com a distância temporal de décadas que a complexidade do sistema de Justiça norte-americano estabelece entre o delito e o suplício.

A “pena de morte à moda brasileira”, ao arrepio da lei e bem mais imediata, foi recentemente saudada por integrantes de uma unidade de elite da Polícia Militar em Altamira, no Pará: “Arranca a cabeça e deixa pendurada”, diz a cantoria ensaiada e assustadora, em cerimônia oficial, diante do governador emedebista Helder Barbalho, que, silenciosamente, sucumbiu ao escárnio promovido pelo comando da corporação.

Há sintonia fina entre o espetáculo paraense e os sinais de ódio que diariamente Jair Bolsonaro emite.
Os dois governantes gostam de matança e cultivam a metáfora da infestação.

Se o presidente racista dos Estados Unidos insulta a cidade de Baltimore, de maioria negra, por ser “infestada” de pessoas que compara a “ratos e roedores”, o presidente do Brasil, além de homenagear a tortura e de atacar nordestinos, defende uma reforma legislativa para dar conforto (“retaguarda jurídica”) para que policiais possam atirar em suspeitos sem o risco de serem responsabilizados. E celebra: “Os caras vão morrer na rua igual barata”.  

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