Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Folhajus

Nunca mais será admitido o argumento da 'legítima defesa da honra'

Argumento foi utilizado por advogados de Doca Street, que se aproveitaram da ignorância, do machismo e do moralismo das pessoas comuns

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Como definir a natureza histórica deste processo, caso Doca Street ou caso Ângela Diniz?

O resultado de uma busca no Google mostra que o tema ainda está em movimento: “caso Ângela Diniz”, 3.890 ocorrências; “caso Doca Street”, 3.290.

Os detalhes do processo, o duelo da defesa e da acusação, protagonizado por notáveis advogados cariocas de outra época, assim como o perfil de uma mulher incomum, que desafiou os valores da sociedade reacionária e provinciana do Rio de Janeiro, estão no podcast “Praia dos Ossos”, produzido pela Radio Novelo –uma pequena obra prima de jornalismo lançada durante a pandemia.

Foram dois julgamentos. No primeiro, venceu a defesa do réu e a tese (hoje inconcebível) da “legítima defesa da honra”, com punição diminuta para quem mata alguém.

No segundo julgamento vingou a tese acusatória: 15 anos de cárcere. O tribunal do júri, soberano e formado por pessoas comuns, é sempre volúvel, como, aliás, são também volúveis os juízes concursados e profissionais.

O Código Penal estabelece três modalidades de homicídio doloso: homicídio comum (seis a 20 anos de reclusão), homicídio privilegiado (pena reduzida de um sexto a um terço) e homicídio qualificado (12 a 30 anos de reclusão).

Matar alguém por vingança ou por traição ou por ser mulher (condutas consideradas mais graves) é diferente de matar alguém porque, por exemplo, foi humilhado durante uma discussão. É natural existir penas diferentes para situações distintas.

A figura da “legítima defesa da honra” não existe no Código Penal. É criação de advogados que se aproveitaram da ignorância, do machismo e do moralismo das pessoas comuns.

O que existe é a redução de pena para situações especiais: quando o réu pratica o crime “impelido por motivo de relevante valor social ou moral” ou sob o domínio de “violenta emoção” logo em seguida a “injusta provocação da vítima”.

O mundo mudou desde o assassinato de Ângela Diniz. As relações afetivas também. Pessoas do mesmo sexo mantêm sociedades conjugais. Mulheres também matam suas mulheres, assim como homens matam seus maridos: é o que se vê no noticiário, ainda que a maioria dos crimes seja de homens contra mulheres.

Mas nunca mais será admitido o argumento da “legítima defesa da honra”, ainda que a violenta emoção esteja presente nas relações afetivas e permaneça nos recintos dos tribunais.

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