Luís Francisco Carvalho Filho

Advogado criminal, é autor de "Newton" e "Nada mais foi dito nem perguntado"

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Descrição de chapéu Folhajus

Biden, injeção letal e Bolsonaro

Iluminismo norte-americano é motivo de inveja no Brasil

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Joe Biden é o primeiro presidente dos Estados Unidos a se opor abertamente à pena capital. Não é pouca coisa. Nos últimos 40 anos, o país executou em média 1 condenado a cada 10 dias. A maior parte da população ainda é a favor.

Em julho de 2019, sem medo de perder votos, Biden tuitava: “Precisamos eliminar a pena de morte”. Neste assunto, até Barack Obama fraquejou. Se a pena de morte o incomodava “profundamente”, ele compreendia sua aplicação para punir crimes hediondos.

A coragem de Biden se apoia em ventos favoráveis à abolição.

A série histórica de pesquisas do Gallup registra que 80% dos norte-americanos eram favoráveis à pena de morte em 1994; em 2020, essa maioria favorável era de 55%. O instituto detectou em 2019 uma marca inédita: 60% da população preferindo a prisão perpétua ao teatro das execuções.

Cresce também a percepção da falibilidade do sistema. Em 2020, seis prisioneiros deixaram o corredor da morte pelo reconhecimento (em tempo) de erros judiciários.

Joe Biden é o primeiro presidente dos Estados Unidos a se opor abertamente à pena capital
Joe Biden é o primeiro presidente dos Estados Unidos a se opor abertamente à pena capital - REUTERS

Mesmo entre conservadores o apoio enfraquece. Por razões ideológicas, abolição significa “menos governo”, mais responsabilidade fiscal (os processos que envolvem pena de morte são muito mais dispendiosos) e mais cultura da vida.

O fato é que o número de execuções vem diminuindo sistematicamente desde 2000, quando foram executados 85 prisioneiros. Em 2009, ano da posse de Obama, foram executados 52, e, em 2017, ano da posse de Donald Trump, foram 23 execuções (todas impostas em âmbito estadual).

Em 2020, seriam só sete, ordenadas por Texas (três), Missouri, Tennessee, Alabama e Georgia, mas Trump resolveu ordenar mais 10 execuções.

Trump é o ponto fora da curva no processo civilizatório. Sinistro, rompeu a moratória informal que vigorava desde 2003 e permitiu, a partir de julho de 2020 (na disputa eleitoral), a execução de 13 réus condenados pela jurisdição federal — três deles em janeiro de 2021, dias antes da posse de Biden. Lisa Montgomery foi a primeira mulher executada sob jurisdição federal desde 1953.

São crimes federais com previsão de pena capital, entre outros, homicídios de agentes de segurança e de presos federais, assassinatos por motivo político ou relacionados a terrorismo, espionagem, traição e tráfico de drogas.

A pena de morte não acaba pela vontade unilateral de Biden. É uma questão essencialmente estadual, mas a sua atuação pode ser decisiva.

Um grupo de deputados democratas se movimenta para apresentar ao Congresso projeto de lei abolindo a pena de morte na esfera federal. Movimentos civis reivindicam a comutação imediata da pena de 49 prisioneiros (21 brancos, 20 negros, sete latinos e um asiático) que aguardam execução de sentenças federais. A expectativa é que o Departamento de Justiça deixe de postular a pena em processos futuros.

Enquanto o Brasil vê a renovação do sombrio governo de Jair Bolsonaro e seus capangas, com o Poder Legislativo aparentemente submisso e a Câmara dos Deputados entregue ao cangaço, a administração Biden emite sinais iluministas.

A ousadia política em relação às mudanças climáticas em um país movido a petróleo e carvão, a oposição ao racismo, a reunificação das famílias de migrantes latinos, criminosamente desfeitas por Trump, a constituição de um gabinete que atende os mais rigorosos critérios de diversidade, assim como a expectativa em torno da abolição da pena capital, são motivos de sincera e compreensível inveja.

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