Não é aleatório. Bolsonaro rasga a Constituição sistematicamente.
Sentindo-se ameaçado pelos números do Datafolha, que mostram a corrosão da sua credibilidade e a recuperação de territórios políticos pela candidatura Lula, e também pela organização metódica de atos e omissões de seu governo, que contará a história do agravamento da crise sanitária no Brasil, Jair Bolsonaro ensaia a radicalização do discurso anticonstitucional.
Seguindo os passos do filho Flávio, o que aprendeu a abocanhar parte dos vencimentos de assessores e funcionários, zomba da CPI e afronta o funcionamento de um dos poderes da República. Xingar o relator de vagabundo não é apenas falta de decoro, é também uma modalidade de intimidação.
Jair Bolsonaro não se conforma com as regras do jogo democrático. Ataca agora as atribuições do Senado, mas o alvo da vez poderia ser o Tribunal Superior Eleitoral, presidido por um ministro que, a seu ver, tem imprópria militância política, e defende a integridade da urna eletrônica.
Já o filho Carlos, o que parece capanga, vereador carioca que despacha em Brasília, age como PC Farias agia no governo Collor, nas sombras.
O princípio da impessoalidade proíbe o mandonismo informal do filho do presidente da República nas coisas da administração federal. Ele não está investido nem de mandato nem de nomeação. É usurpação política pura.
Por que Carlos participa de reunião com fabricante de vacina? Quem organiza a participação de Carlos em encontros palacianos? Carlos também queria alterar, por decreto presidencial, a bula da cloroquina, para que o medicamento fosse considerado eficaz contra a Covid-19? O vereador conversa, ainda que indiretamente, com militares, fabricantes de armas, caminhoneiros e policiais? A lista de curiosidades é, de fato, imensa.
A CPI tem legitimidade constitucional para fazer o que a Procuradoria da República não tem coragem: investigar o filho que participa de uma ala fantasma, clandestina, da governança do país.
O bolsonarismo dissemina diariamente ideias fora do lugar, distorcendo o sentido de regramentos constitucionais. O presidente comanda as Forças Armadas, mas não pode fazer uso político ou pessoal da instituição e violar o pacto federativo.
O Exército não existe para, em matéria de segurança pública, atuar contra, por exemplo, restrições impostas na pandemia por prefeitos e governadores, ainda que a pretexto de assegurar a vigência da liberdade de ir e vir.
O Exército não existe para ocupar as ruas de cidades governadas por oposicionistas (como se estivesse “esgotada” a capacidade da Polícia Militar de fazer policiamento ostensivo e preservar a ordem) em dia de visita do presidente da República.
Flertar com o arbítrio e com a violência é, por si só, delito político do governante.
Quando parabeniza a polícia do Rio de Janeiro pelo massacre de Jacarezinho, Bolsonaro é solidário às milícias e a uma instituição corrompida, que mata à toa e reclama do ativismo do STF.
A Constituição assegura que todos, traficantes inclusive, sejam tratados a partir do princípio da igualdade e da legalidade.
Assim como acreditava na circulação desenfreada do vírus como estratégia de enfrentamento da pandemia, Bolsonaro investe na letalidade policial e reivindica imunidade por erros e abusos cometidos na atividade repressiva.
Variante de Midas, tudo que Jair Bolsonaro toca se transforma em estrume.
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