Luiz Horta

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Lanche de pernil do bar Estadão tem carne perfeita em refúgio 24 horas

Sanduíche tem molho saboroso, é feito com cuidado e mantém a umidade da carne

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Uma boa definição de metrópole: são aquelas cidades de 24 horas (adaptei de uma frase de Edmund White), onde tudo está disponível o tempo todo. São Paulo era assim.

O famoso sanduíche de pernil do bar Estadão, que funciona 24 horas
O famoso sanduíche de pernil do bar Estadão, que funciona 24 horas - Gui Gomes/Folhapress

Durante muito tempo fiz supermercado às 3h. Hoje, quem faz minhas compras são aplicativos e nem saio de casa para isso.

O necessário drinque do final da noite, uma sede de martíni às 5h no lobby de um hotel, coisa que também acho uma alegria, praticamente sumiu —cada vez bebo menos drinques, mas gosto de saber que estarão lá, impecáveis, na hora que quiser.

Anos atrás, saí procurando essa raridade (no caso, era a busca por um negroni) e fui salvo pelo Maksoud Plaza, no que os franceses chamam de hora azul, a quebra de segundos que separa a noite da manhã 
e a tarde da noite. 

Garçons montavam o café da manhã para os hóspedes, mas o bar servia a bebida,  enquanto o sol nascia, como se fosse coisa trivial.

A cidade não pode ser menos metropolitana em tamanho, vertical e horizontal, mas apequenou-se em ofertas para os caprichos dos notívagos.

Restou, e muito bem, além dos caixas eletrônicos (nem eles funcionam o dia todo), o sanduíche de pernil do bar Estadão.

Quero louvá-lo não só por ser guardião desse valor (estar lá o tempo todo, fiel e imutável), e sim porque continua uma delícia. 

Muito já se escreveu, aqui mesmo neste jornal (Josimar Melo tentou diversas vezes desmitificar a coisa), sobre outro sanduíche considerado emblema paulistano, o de mortadela do Mercadão.

Aquilo é só uma aberração, um pão francês com quantidade desmesurada de mortadela dentro. Vamos nos esquecer dele.

O sanduíche de pernil do Estadão é gastronomia, tem um pernil perfeito, molho saboroso, é feito com cuidado e mantém a umidade da carne, o volume de recheio e o sabor e o equilíbrio entre eles.

Já passei por lá em horas santas e noutras bem peculiares, uma vez com um chef franco-ítalo-brasileiro, que queria algo para comer e beber.

Ele, com uma taça de cristal Riedel na mão, pediu ao balconista que a enchesse de catuaba (primeira e provavelmente última vez que provei essa bebida, não era exatamente ruim, mas prefiro vermute). 

A variada população que estava na lanchonete olhou sem surpresa o capricho (nem um extraterrestre causaria espanto ali). 

Todo paulistano, em alguma noite de fome pós-festa, ou balada, ou apenas por ser notívago, passou por aquele oásis de alimentação permanente.

Dias atrás, precisei comer depois da feira de vinhos a que fui, comi um sanduíche e trouxe outro para casa, e me orgulhei por esse inalterável sanduíche. 

Aonde vão os que têm fome e sede na madrugada? Não quero pensar que lojas de conveniência de postos de gasolina sejam o triste destino da fama de cidade onde se pode ter tudo o tempo todo.

Estou esperando respostas.

Bar Estadão

Viaduto Nove de Julho, 193, centro, tel. 3257-7121. De seg. a dom.: 24h

 

Conheça um produtor

Sanduíche vai com tudo, então vou usar o espaço para falar de um português admirável, Vasco Croft. Ele é da região do vinho verde e se dedica, especialmente, à casta que me encanta, a loureiro. 

Sua outra uva é a vinhão, o meu terror na adolescência, pois é a variedade usada nos vinhos verdes tintos.

Minha família, sempre meio exótica, achava a mais sublime combinação a de bacalhau com vinho verde, até aqui tudo bem —mas tinto. 

Era como passar uma lixa na língua. De tamanha agressividade, parecia castigo. Felizmente, o vinhão de Vasco Croft é de outra estirpe.

Continua com pronunciada acidez, característica da uva, mas é sutil, mineral e, esse sim, iria bem com bacalhau. O Aphros Ten é o mais básico, feito para ser bebido logo.

Depois, em ordem de complexidade e longevidade, vêm o Daphne, mais encorpado pelo longo estágio em madeira, e o espetacular Phaunus Amphora, sua versão para vinhos âmbar —também chamados de laranja, são aqueles em que as cascas permanecem longamente em contato com o mosto. 

Não são vinhos que agradem a todos, até pelos preços. Mas, já que economizei no sanduíche, posso gastar numa garrafa. Com o pernil, uma taça de Daphne.

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