Luiza Duarte

Correspondente na Ásia, doutora em ciência política pela Universidade Sorbonne-Nouvelle e mestre em estudos de mídia pela Universidade Panthéon-Assas.

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Quem fez as suas roupas?

Crise de resíduos têxteis requer ações contra ciclo de produção e fast fashion

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Operárias chinesas trabalham em máquinas de costura em fábrica
Operárias chinesas trabalham em fábrica na cidade de Rongjiang, na província de Guizhou - 18.abr.2019/AFP

Nunca se comprou tanto e se descartou roupas tão rápido.

Do início dos anos 2000 até agora, a produção dobrou de tamanho e o ciclo de vida de cada peça foi encurtado. A China é o maior produtor mundial de roupas e tecidos e o líder mundial do comércio eletrônico. O fast fashion transformou a indústria da moda.

Quase 20 anos depois, o mundo lida com uma crise de resíduos têxteis.
 
O país mais populoso do globo digitaliza sua economia com uma velocidade impressionante. Aplicativos revolucionaram a compra online, com pagamento fácil, entrega rápida e segura.

O Taobao, plataforma chinesa de vendas online semelhante a Amazon, tem mais de 800 milhões de itens à venda. Blusas e vestidos podem sair por menos de R$ 20. Roupas baratas são compradas em um clique e entregues nas grandes cidades em algumas horas.

As restrições de vestimentas do século XX ficaram para trás, chineses hoje têm acesso a uma infinidade de marcas e produtos.

 

As redes sociais alimentam o consumo de roupa descartável. Anúncios personalizados e a febre do live streaming —que mistura vendas e entretenimento encorajam um modelo de compra excessiva, de desperdício e de geração de toneladas de lixo.
 
O consumo médio mundial de têxteis novos é de 13 kg por pessoa, de acordo com a Textile Beat 2016. Já a média dos americanos, que ainda mantêm o título de maiores consumidores do mundo no setor, é de 37kg.

A previsão é que as vendas globais cresçam e o consumo de vestuário aumente em 63%, passando de 62 milhões de toneladas hoje, para 102 milhões de toneladas em 2030.
 
Enquanto países como Austrália e os EUA importam mais de 90% das roupas que consomem, a produção chinesa abastece a demanda interna e a de marcas europeias, americanas e até brasileiras.

Na China, nos últimos anos, o setor passa por ajustes diante do aumento dos salários, da melhoria das condições de trabalho e dos mecanismos regulatórios.

A elevação do custo e a gradual transição da produção de manufaturas de baixo custo para manufaturas de ponta faz fábricas trocaram as grandes cidades do leste do país pelo interior ou por países no sudeste da Ásia e da África.

Bangladesh é o segundo maior produtor de roupas depois da China. Em setembro do ano passado, o governo local elevou o salário mínimo em mais de 50% para chegar a R$ 375 (U$95.5).

Um aumento não acontecia desde o desastre do Rana Plaza, acidente que matou mais de mil mulheres em uma fábrica do país em 2013 e chamou a atenção do mundo para as abusivas condições de trabalho no setor. 

A mão de obra é esmagadoramente feminina e enfrenta cargas horárias extenuantes, condições insalubres, remuneração abaixo do piso salarial e falta de proteção social para doença ou maternidade.

Regulação

Mesmo se o preço e o modelo são os fatores decisivos da compra, consumidores cada vez mais querem saber como os produtos foram feitos e de onde eles vieram.

Campanhas globais pelo consumo consciente e por mais transparência na indústria da moda, como a Fashion Revolution (#quemfezsuasroupas), apenas engatinham na Ásia, mas a pressão sobre marcas ocidentais já produz alguns sinais.
 
O aumento do mercado de produtos sustentáveis, selos, índices e pesquisas visando uma cadeia produtiva mais ética e segura para funcionários e para o meio ambiente.

Novos tecidos, pontos de coleta de roupas usadas, design mais eficiente e o despertar para a necessidade de reutilização e redução de resíduos e de recursos naturais, como a água.
 
O governo britânico lançou um plano de ação para fazer com que grandes marcas reduzam a volume de lixo gerado, de água gasta e a pegada de carbono.

Também é estudada a criação de mecanismos de responsabilidade para fabricantes e revendedores de roupas, semelhante ao que já acontece com baterias e eletrônicos. Empresas podem ter que  pagar pela recuperação de resíduos.
 
O custo social e ambiental de peças baratas deve forçar governos a olharem para o fast fashion da mesma forma que para sacolas plásticas e canudos. 

Os próximos anos vão trazer para as roupas os mesmos questionamentos que enfrentam o uso de plástico descartável e a produção e o consumo de alimentos.
 
Da leitura de rótulos à leitura de etiquetas, o consumidor também têm alternativas. Comprar menos e comprar melhor, de segunda mão ou vintage, alugar, escolher produtos de melhor qualidade e fazer com que eles durem, consertando ou transformando as peças.

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