Luiza Duarte

Correspondente na Ásia, doutora em ciência política pela Universidade Sorbonne-Nouvelle e mestre em estudos de mídia pela Universidade Panthéon-Assas.

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A polícia como inimigo

Abuso policial desperta revolta de manifestantes em Hong Kong

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Depois de semanas de protestos que levaram ao engavetamento do projeto de lei de extradição em Hong Kong, a indignação popular tem novo alvo: a polícia.
 
As cenas de abuso policial durante a onda de manifestações pacíficas no território autônomo chinês geraram revolta.

Enquanto um ínfimo grupo de manifestantes esbravejou e atirou objetos contra policiais, oficiais bem equipados da tropa de choque responderam com força. Os confrontos deixaram 58 manifestantes e 22 policiais feridos.

Polícia entra em conflito com manifestantes durante protesto contra projeto de lei de extradição em Hong Kong
Polícia entra em conflito com manifestantes durante protesto contra projeto de lei de extradição em Hong Kong - Anthony Wallace - 12.jun.19/AFP

Para justificar a violência, a polícia chamou os protestos do dia 12 de junho de “tumulto”, ação que abre as portas para severas consequências legais.

A ex-colônia britânica garante o direito à manifestação, já o “tumulto” pode ser punido com até dez anos de prisão.
 
Da mesma forma como ocorreu em 2014, a ação violenta das autoridades serviu não para dispersar, mas para mobilizar ainda mais manifestantes nos dias que viriam.

O uso desproporcional de gás lacrimogêneo, spray de pimenta, balas de borracha e pela primeira vez do bean bag, outra munição não letal, vem provocando novos protestos, dessa vez contra a atuação das forças de segurança.
 
A sede da polícia de Hong Kong foi cercada por milhares de manifestantes na última sexta-feira (21), e ovos foram arremessados no brasão da instituição.

Os gritos pediam a liberação de manifestantes presos, a abertura de uma investigação sobre abuso policial e a demissão do secretário de Segurança, John Lee, e do chefe da polícia local, Stephen Lo.
 
Dias antes, um raro protesto feminino já havia apontado o dedo para a polícia. Cerca de 6.000 mulheres condenaram a brutalidade policial em frente à sede do governo.

Com cartazes com os dizeres "tire as mãos dos nossos filhos", "todo o poder para a juventude de Hong Kong" e "não atire nos jovens", elas tentaram conter a escalada de enfrentamento nas ruas.

Outro protesto reuniu profissionais da saúde e do setor jurídico para denunciar a prisão de manifestantes que buscaram atendimento médico em hospitais públicos. Uma nova forma de ameaça que fere as garantias legais vigentes.
 
A efervescência política na ilha de Hong Kong, onde estão escritórios na Ásia dos principais veículos internacionais, tem rendido ampla cobertura internacional. 

Novos protestos estão marcados, e está em curso uma campanha de financiamento coletivo para a publicação de uma carta aberta sobre a erosão das liberdades na capa de jornais estrangeiros e, com isso, pressionar a opinião pública internacional às vésperas da Cúpula do G20, no Japão.

Nessa semana, o Reino Unido suspendeu as licenças de exportação de equipamentos para a tropa de choque de Hong Kong e pediu que o território conduza uma investigação independente sobre os confrontos entre polícia e manifestantes.

O território autônomo chinês não tem Exército e conta com um efetivo de 30 mil policiais. A polícia de Hong Kong é uma das mais antigas do mundo e carregou por muito tempo a reputação de ser a melhor da Ásia, a mais sofisticada, menos corrupta e com a melhor performance, embora falte preparo e mecanismos para lidar com o feminicídio e a violência doméstica.

Mesmo assim, o centro financeiro asiático é uma cidade extremamente segura. Aparece em 9º lugar no ranking das cidades com maior segurança em 2017 do Economist Intelligence Unit, com baixo índice de crimes violentos, oficiais bem pagos e treinados, taxa de criminalidade em queda. Estatísticas de fazer inveja às capitais brasileiras.
 
Mas a instituição vem se tornando um inimigo público. O abuso policial —que pode parecer banal para o leitor brasileiro acostumado a doses diárias de violações perpetuadas pelas forças policiais nas grandes cidades do país— é intolerável para os padrões de Hong Kong.

A ação violenta contra manifestantes é vista como termômetro da erosão da autonomia política e das liberdades civis no território.

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