Luiza Duarte

Correspondente na Ásia, doutora em ciência política pela Universidade Sorbonne-Nouvelle e mestre em estudos de mídia pela Universidade Panthéon-Assas.

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Luiza Duarte

Dentro dos protestos em Hong Kong

Crise política interna é a maior enfrentada pela China nos últimos cinco anos

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Na tarde de domingo em Hong Kong, a principal linha de metrô da cidade aos poucos vai enchendo de pessoas vestindo preto. Muitos em grupo, outros sozinhos, casais. Eles são, com frequência, jovens.
 
Milhares de pessoas se reúnem mais uma vez no Parque Victória, local histórico de mobilização civil no território autônomo chinês, única parte da China onde protestos são permitidos. Organizadores falam em 430 mil pessoas, polícia, em 138 mil.

De lá, caminham tranquilamente até Wanchai, bairro que concentra embaixadas e prédios públicos. O trajeto oficial é mais curto do que o habitual. O Fronte Civil de Direitos Humanos —que faz os pedidos de permissão de passeata junto à polícia, apesar de a mobilização não ter líder— tem esbarrado em uma burocracia cada vez menos receptiva, conforme os protestos persistem.
 
Do alto do carro de som, dois homens gritam em cantonês “povo de Hong Kong, não vamos desistir de lutar pelo que acreditamos”, e passantes gritam com eles “ga yau” —“coloca óleo”, na tradução literal do cantonês.

A expressão, que significa “vamos em frente”, é o som mais ouvido nos protestos. O trajeto autorizado termina nessa concentração, mas manifestantes seguem no asfalto quente rumo ao coração da ilha.
 
“Meu pai concorda comigo, mas sei que muitas pessoas mais velhas acham que os adolescentes estão errados. Pensam isso por causa da violência, mas acho que não sabem o que a China faz para a gente. A maior parte da informação que eles recebem vem da TVB (principal canal da televisão aberta de Hong Kong, que há uma década ganhou o apelido de “CCTVB” para indicar que o veículo se tornou um braço da televisão estatal chinesa), e as notícias de lá não são objetivas”, conta SW, de 17 anos.
 
Ela não lê o noticiário em inglês, informa-se na internet, em fórum em cantonês como o LIHKG, uma versão local do americano Reddit lançada em 2016. A plataforma se tornou o espaço de discussão das estratégias para os protestos desse ano.
 
A identidade coletiva, o orgulho de ser honconguês é celebrado em novas paredes de post-it coloridos que se formam com a passagem dos manifestantes. “É uma maneira das pessoas expressarem seus sentimentos, muitas estão estressadas e deprimidas", conta Nick, 30. “Eu vou continuar vindo para a rua até o governo responder às nossas demandas. Até agora, tudo que eles fizeram foi se esconder.”

O projeto de lei de extradição foi o estopim para uma batalha em defesa dos direitos civis no território que retornou ao domínio chinês há mais de duas décadas.

A adrenalina da desobediência civil é palpável, quando no cair da noite mais e mais manifestantes colocam máscaras para não serem identificadas e equipamentos de proteção.

Capacetes amarelos, guarda-chuvas e medicamentos para tratar os efeitos do gás lacrimogêneo e spray de pimenta chegam em grandes sacolas. Pontos de distribuição se organizam, mas ninguém sabe dizer de onde os itens vieram.
 
Manifestantes se dividem entre a área próxima do governo de Hong Kong, do Supremo Tribunal e do escritório de representação da China. No caminho, voluntários avisam sobre as opções de transporte para quem escolher voltar para casa e alertam que continuar pode trazer consequências legais.
 
Passam pessoas carregando rolos de plástico filme para proteger braços descobertos. Se formam grupos de homens com luvas, óculos e rosto inteiro coberto, e os postos móveis de assistência médica se multiplicam.

O confronto parece inevitável. Na internet, começam a aparecer informações sobre os primeiros pontos de tensão.
 
Por volta das 22h, a tropa de choque começa a tentar liberar as ruas e monta uma barreira a mais de 3 km de onde o protesto tinha previsão de terminar.

Escudos, sirenes, bandeiras e alertas pelo alto-falante. Moradores nas janelas dos prédios. Um voluntário chama jornalistas na esperança de que a presença de câmeras possa inibir a violência policial.

Depois da trocas de ameaças, os manifestantes avançam e da linha de contenção das forças de segurança voam as primeiras granadas de gás lacrimogêneo.

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