Luiz Felipe Pondé

Escritor e ensaísta, autor de "Notas sobre a Esperança e o Desespero" e “A Era do Niilismo”. É doutor em filosofia pela USP.

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Luiz Felipe Pondé

Churrasco na varanda

Bolsonaro deve parar de governar como se estivesse na sua casa na Barra

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Se o presidente Bolsonaro não começar a entregar logo o que mais importa em seu governo (melhor desempenho econômico, as reformas para tal e medidas funcionais para, pelo menos, melhorar a insegurança pública), um mal-estar se instalará. 

Esse mal-estar levará o dólar a subir, a bolsa a cair, os investidores a fugir e à desconfiança generalizada —e mesmo a uma certa depressão pós-mania (a mania aqui foi a confiança eufórica depositada na administração Bolsonaro, que agora parece perdida nos seus âmbitos familiares e reacionários mais estreitos). 

E, como todo mundo sabe, reacionários são ruins para os negócios. Esse grupo boçal ao redor da administração Bolsonaro pensa que foi ele quem o elegeu, mas essa percepção é típica de quem vive alienado da realidade. Quem elegeu Bolsonaro, na sua maioria, detesta seu clã, seus idiotas paranoicos e seus churrascos na varanda. 

Ilustração publicada nesta segunda-feira, 11 de março de 2019
Ilustração publicada nesta segunda-feira, 11 de março de 2019 - Ricardo Cammarota/Folhapress

Esse mal-estar nascerá a partir dos dois superministérios (Guedes e Moro), que começarão a se sentir desautorizados (conflitos com política de armas, desconvites a especialistas por razões ideológicas, vaivém confuso das declarações do presidente sobre a reforma da Previdência e futuros “bate-cabeça na parede” em questões essenciais). 

O núcleo militar, que nunca foi simpático à candidatura Bolsonaro e sua tentativa de se oferecer como “opção militar democrática”, também monitora cada vez mais de perto o desempenho do presidente, do seu clã, dos idiotas paranoicos de costumes (que impactam direitos humanos, educação, diplomacia) e as reações nas mídias sociais e na mídia em geral. 

O vice-presidente Mourão cada vez desponta como figura mais confiável, mais equilibrada, com visão mais ampla da política e geopolítica, e vence, ainda que vagarosamente, os preconceitos que muita gente alimenta contra os militares.

A relação com o Legislativo, sob a batuta de Rodrigo Maia, fiador das grandes reformas e senhor todo-poderoso de Brasília, de repente pode azedar se deputados e senadores sentirem que Bolsonaro “cheira” a Dilma. 

Os evangélicos brasileiros, mais próximos aos idiotas paranoicos de costumes, têm um histórico político pragmático e fisiológico, e nada prova que ficarão ao lado de um Titanic que pareça rumar em direção ao iceberg.

O STF, como tem demonstrado, seguirá o curso da maioria e da opinião pública (“a voz das ruas”), fazendo-se poder representativo, o que não é, porque, afinal de contas, ele também é cada vez mais contaminado pela democracia e sua fúria por visibilidade e fama.

Enfim, a opinião pública, que mesmo tendo elegido Bolsonaro, na sua maioria não compactua com seu clã e com o núcleo paranoico e reacionário que parece estar mandando no presidente. 

As mesmas mídias sociais, que agora são arma na mão do seu clã e dos idiotas paranoicos, poderão se virar rapidamente contra o presidente e a lua de mel acabar num mar de pressão contra a administração Bolsonaro.

Bolsonaro deve acordar e parar de governar como se o país fosse um churrasco na varanda de sua casa na Barra da Tijuca. O problema não é só estético (rider com paletó, camiseta amarela no Planalto, ainda que isso faça a moçada “com verniz” ir às raias da náusea); o problema adentra o terreno da compostura protocolar.

Bolsonaro deve afastar seu clã do Planalto e deixar que eles brinquem no parque —de briga, sendo este seu gosto. Bolsonaro deve afastar todos os representantes da ala paranoica conspiratória que parece mandar nos meandros do Planalto. E mais, deve perceber que foi eleito pra deixar Guedes e Moro trabalhar em paz. 

Bolsonaro parece ser muito sensível ao que os idiotas reacionários das redes berram. Idiotas são más companhias quando você não está apenas falando merda num churrasco na varanda. 

Se essa rota não mudar, o país mergulhará em inquietação de novo. A esquerda terá mais do que razão em recuperar seu discurso “avisei no que ia dar” (o que é péssimo, porque a esquerda tem se revelado bastante canalha eticamente e politicamente nos últimos anos no país). 

Uma atmosfera (já conhecida por nós) pode se formar ao redor da ideia de que um novo arranjo palaciano pode ser a melhor opção para o país. Não necessariamente um novo impeachment, mas o presidente pode acordar vestindo roupas de uma rainha da Inglaterra trans.

Isso não é bom para o país. Sofreremos muito. O melhor é que Bolsonaro saia, definitivamente, da sua varanda da Barra da Tijuca e vá para Brasília.

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