Luiz Felipe Pondé

Escritor e ensaísta, autor de "Notas sobre a Esperança e o Desespero" e “A Era do Niilismo”. É doutor em filosofia pela USP.

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Luiz Felipe Pondé

O bloquinho dos inteligentinhos

O mundo atual criou uma nova forma de estupidez: a estupidez com 'causa'

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Como é Carnaval, vamos olhar para o bloquinho dos inteligentinhos. Visto de um certo ângulo, um inteligentinho parece ser um bobo vestindo Prada. Visto de outro, vemos seu título de doutorado. Visto ainda de outro, parece um Chucky.

O mundo contemporâneo criou uma nova forma de estupidez: a estupidez chique. Para exercê-la, você deve ter uma “causa” que a justifique. Vejamos alguns exemplos.

1. Artistas inteligentinhos. Recentemente o cantor Roger Walers deu mais um exemplo do que é ser um artista riquinho que confunde o mundo com seu apartamento chique em Londres ou Nova York (temos alguns de produção nacional que fazem a mesma coisa). Apoiou “artisticamente” a ditadura Maduro, ditadura essa que mata pessoas de fome e de outras formas. Nosso artista já havia se metido onde não é chamado aqui no Brasil no ano passado, levando inteligentinhos às lágrimas ao se meter na polarização durante as eleições, claro, sem entender patavina a não ser algo que leu às pressas em alguma câmara de eco que esse tipo de artista gênio frequenta. Outro exemplo é seu claro antissemitismo travestido de antissionismo, falando do Oriente Médio, essa coisa “exótica” para europeus “cultos”.

2. Prefeitos de São Paulo. Essa gente bacana. O anterior, supostamente, especialista em urbanismo (normalmente essa gente urbanista é gente autoritária que frequenta coluna social e “se acha”), pintou a cidade de vermelho para riquinhos da zona oeste e que fazem sociais ou audiovisual brincarem de Amsterdã. E para quem é dono de seu próprio negócio e mora perto desse seu negócio. Enquanto brilhava nos palcos no exterior e em nossos salões cheios de inteligentinhos, como especialista na cidade do futuro, construída a partir de concepções de mobilidade urbana progressista (tenho medo de gente “progressista”, porque normalmente é gente autoritária e sem pecado), as pontes de São Paulo estavam ruindo sobre nossas cabeças. Nós, essa gente atrasada que não frequenta coluna social progressista e não entende nada de mobilidade urbana a não ser se ferrar com as pontes ruindo. E , agora, o atual prefeito, enquanto as pontes caem, quer transformar o Minhocão num jardim (dane-se o trânsito) e proibir canudinhos de plástico. Sei. Os inteligentinhos devem pensar que sou um antiambientalista neolítico. Não, na verdade, suspeito que o clímax da humanidade tenha sido o alto paleolítico, quando não tínhamos riqueza suficiente para produzir inteligentinhos.

Ilustração de Ricardo Cammarota para coluna de Luiz Felipe Pondé 4.mar.2019
Ricardo Cammarota

3. Pais e escolas bacanas de crianças. Este tipo de inteligentinho é um risco enorme porque exerce sua estupidez sobre quem não tem idade para se defender. Olha só que caso absurdo. Um exemplo desse bloquinho novo chamado “idiotas de gênero”. Pais de um menino o fazem se vestir um dia de menino, outro dia de menina, para ele ver o que ele “prefere” ser. Será que não sobrou um psicólogo que não seja inteligentinho para explicar para esses pais o absurdo que estão fazendo? Ou alguma juíza mais razoável vai ter que se meter no assunto e declarar esses pais idiotas hipossuficientes? O menino vai à escola de vestido e com tranças para experimentar sua “identidade de gênero”? Será o vestido curtinho para ele ensaiar frases do tipo “meu corpo, minhas regras”? Os pais confundem o sexo do filho com a marca do celular: o que você quer? Samsung ou iPhone? E mais: uma escola chique de São Paulo criou um hábito, segundo me dizem, de se referir às crianças pelo sobrenome para não pressioná-las a assumir o gênero do nome que os pais puseram nelas. E depois esses inteligentinhos se perguntam de onde saiu a Damares! Saiu da estupidez dessa histeria ao redor dos “idiotas de gênero”. Silva! Santos! Nunca: Patrícia, Marcos. De jeito nenhum! Chamar pelo nome é opressão de gênero?

4. E, para completar o cenário, os “idiotas paranoicos”. Como alguém no exercício da função de um ministério pode mandar instituições  usarem “à la Stálin”  o celular para filmar momentos cotidianos e enviar para Brasília? Imagine se o Lula tivesse mandado as escolas cantarem a Internacional e filmar o ato para mandar para Brasília? Desde quando cantar o hino nacional é o problema da educação? Por favor, Guedes, feche o MEC de uma vez.

Será que um dia o STF terá de julgar até onde vai o direito de um inteligentinho causar danos aos outros com sua estupidez? Os “idiotas de gênero” continuarão a exercer sua “opressão progressista”? Os paranoicos tomarão medicação em vez de atrapalhar o governo?

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