Lulie Macedo

Foi editora na Folha por 16 anos e é sócia da consultoria de cultura urbana Rolê

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Lulie Macedo
Descrição de chapéu Copa do Mundo

A pior cegueira é só enxergar a bola

O aspecto que mais me interessa no futebol não é o futebol

São Paulo

Foi ou não pênalti, chances desperdiçadas, posse de bola proporcional à quantidade de sofrência per capita.

Hahahahahaha, te peguei.

Para o conteúdo estritamente futebolístico, favor se dirigir aos ilustríssimos colegas desta cobertura.

Neymar exibe corte de cabelo diferente na véspera da estreia do Brasil na Copa
Neymar exibe corte de cabelo diferente na véspera da estreia do Brasil na Copa - Eduardo Knapp/Folhapress

O aspecto que mais me interessa no futebol não é o futebol. Porque quase tudo o que vale para o esporte vale para a vida. E a última semana existiu para não me deixar mentir. Quer ver?

Cortes de cabelo. Do cascão em 2002 ao miojo de 2018. Devemos ter sérias questões enraizadas nas profundidades do inconsciente coletivo em relação a esse assunto. Porque estamos aí, discutindo penteado de jogador, desde Caniggia e Valderrama, na Copa de 1990 --provavelmente antes disso, os mais longevos podem esclarecer.

Qualquer um que já usou uniforme na vida sabe, o que sobra para expressar alguma identidade é cabelo, pele (tatuagem) e tênis (ou chuteira). E qualquer um que já considerou ser ídolo mundial (cof, cof) conhece bem o valor da atenção das pessoas (e das verbas publicitárias) para a construção de imagem. Sabendo disso tudo, por que a gente simplesmente não consegue superar um cabelo "fora do padrão"?

Outro lance sem bola: gente que recolhe o próprio lixo antes de ir embora. Diz mais sobre nós ou sobre eles que japoneses, senegaleses e uruguaios tenham causado espanto ao limpar as arquibancadas depois dos jogos?

A relação dicotômica de uma certa geração com a tecnologia --pergunta para uma pessoa de 11 anos o que ela acha do VAR, por exemplo. Vai receber a mesma indiferença se questionar por que ela "passa muito tempo ao celular". A relação entre desconfiança e tecnologia, no caso do árbitro de vídeo, está sendo regulada pelo saudosismo. Vale para o futebol, vale para a vida.

Por fim, as lágrimas. Deixando de lado o lugar escolhido para o "descarrego" (porque no caso de Neymar chorar em campo faz TODA a diferença), testemunhar a fragilidade alheia, teatralizada ou não, é quase sempre um espelho. Se tiver um Philippe Coutinho por perto, então, estamos lascados, porque não existe soluço que alivie dor mais dolorida que a de cotovelo.

E ainda há quem acredite que, para falar de Copa, é preciso falar de jogo. Sabem de nada esses inocentes, né não, Nelson Rodrigues? No futebol, parece que a pior cegueira é só enxergar a bola.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.