Manuela Cantuária

Roteirista e escritora, é criadora da série 'As Seguidoras' e trabalha com desenvolvimento de projetos audiovisuais

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Manuela Cantuária

'O conflito de uma mulher negra cadeirante lésbica plus size é universal'

Por dentro, ela é apenas um homem; isso é lugar de fala

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“Então, chamei você aqui porque a gente está com uma oportunidade muito interessante em uma plataforma de streaming, e acho que você é O Cara que vai me ajudar a contar essa história e roteirizar esse filme como ninguém.”

“Opa, já fiquei empolgado. É sobre o quê?”

“Ah, superação, protagonismo feminino, racismo, essas coisas.”

“Essas coisas… Como assim? Porque eu sou um homem branco. O lance da superação até vá lá, teve uma vez que meu cartão foi bloqueado em um bordel em Berlim e foi o maior perrengue, mas de resto acho que me falta um pouco de vivência.”

“Não se preocupa, essa questão da representatividade a gente resolve no elenco. Pensei em chamar a Bruna Linzmeyer para o papel principal.”

“A Bruna é excelente, só não é negra.”

Ilustração de Silvis para coluna de Manu Cantuária de 24.nov.2020
Silvis/Folhapress

“E se ela sofrer racismo reverso? Esse filme eu nunca vi.”

“Melhor não ir por aí, vai por mim. Será que a gente não repensa o casting?”

“Esse casting foi muito bem pensado, a atriz é lésbica assim como a nossa protagonista. Inclusive, a trama B do filme é ela correndo atrás de seu grande amor. Porque o fato de ela ser cadeirante não a impede de conquistar a mulher que ama e romper todas as barreiras.”

“Então, não sei como te falar isso, mas talvez eu, e você, não sejamos as pessoas mais indicadas para contar essa história.”

“Isso é discriminação. O conflito de uma mulher negra cadeirante lésbica plus size é um conflito universal. O que importa é o objetivo da personagem. O que a protagonista quer? O que ela precisa?”

“E qual seria esse objetivo?”

“Um pênis.”

“Mas ela não era lésbica?”

“Ela quer mudar de sexo.”

“Então ela é trans.”

“Ele é trans, Celso! Entendeu por que eu te chamei? Por fora, a protagonista pode ser uma cadeirante lésbica negra plus size atormentada por traumas sexuais do passado e que foi abandonada pela mãe narcisista. Mas, por dentro, ela é apenas um homem. Como eu, como você. Isso é lugar de fala. E aí, vamos pra Hollywood? Vamos trazer esse caneco pra casa? Topas?”

“Tá, mas posso contar com uma consultoria pelo menos?”

“Claro, eu tenho um sobrinho que está louco para entrar nesse mercado, o Enzo. Ele fez intercâmbio na África do Sul.

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