Um homem desperta na cadeira encardida de uma sala de espera. Um ambiente com ares asfixiantes de repartição pública, insuficientemente arejado por um ventilador que soa como uma cigarra sendo torturada com uma pinça, e uma mesinha lateral abarrotada de revistas femininas puídas, da década de 1990, com dicas de como agradar seu parceiro na cama. Ele aborda a recepcionista.
"Oi. Desculpa a confusão, mas... Onde é que eu estou?"
"Seja bem-vindo. Quer um pirulito? Pega um primeiro."
"Não, obrigado. Só queria entender que lugar é esse."
"Temos vários sabores. De framboesa; tutti-frutti; esse aqui vem com chiclete dentro, mas cuidado que gruda no dente, pra quem tem obturação é um perigo; e esse deixa a língua azul, no caso de o senhor ser mais excêntrico e/ou infantilizado."
"Você não vai responder à minha pergunta?"
"Pega um pirulito e eu respondo, vamos combinar assim?"
"Que maluquice. Pronto. Vai falar agora?"
"O senhor está no inferno."
"Eu morri? Meu Deus. Com todo o respeito, mas isso não parece o inferno."
"Nosso setor não dispõe de labaredas de fogo eterno e tortura medieval, senhor. Infelizmente vamos ficar devendo."
"Setor?"
"A alma do senhor foi despachada para o departamento destinado a homens heterossexuais que não performam sexo oral em suas parceiras. Se quiser um conselho, melhor aquecer os músculos da sua língua porque ela está prestes a trabalhar por toda a eternidade. Temos um estoque infinito de sacolé, tampa de iogurte, bala, tamarindo, manga até fora de época... O que não falta é opção."
"É pegadinha? Nunca ouvi falar disso."
"Pra início de conversa, é uma questão de bom senso. E mesmo assim a gente tá com um problema sério de superlotação porque quatro em cada dez homens não são adeptos da prática. Parece que a mensagem não ficou clara, o rapaz responsável pela ata acabou omitindo da lista de pecados. Mas ele tá aqui também, na seção de mariscos, é um barbudo, baixinho, o Mateus, o senhor vai conhecer, uma figura."
"Você não tá entendendo, tem algum engano aí. Eu fazia sexo oral na minha namorada."
"Sério?"
"Claro, pra rir tem que fazer rir, né? Às vezes ficava até cinco minutos inteiros."
"Já entendi o que aconteceu. Foi erro nosso mesmo, me desculpa. O departamento dos homens que fazem sexo oral de má vontade é no final do corredor, à direita."
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