Mara Gama

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Mara Gama

Plantando a sombra de amanhã

Perspectiva de uma cidade mais fresca, menos poluída e acolhedora ao pedestre incentiva plantio de árvores em canteiros e praças

São Paulo, 22 de dezembro, 7h da manhã, 25 graus de um verão escaldante, pouco movimento de carros.

No canteiro central de uma grande avenida, um professor de espanhol abre sua sacola de feira e tira mudas de 10 a 20 centímetros de espécies frutíferas, que começou a cultivar na própria casa em pequenos vasos. Com sua pá, cava nichos no gramado rente na terra compactada. "É muito dura." Persiste e consegue criar nichos.

André Costa Cabral mora na Vila Sônia há dois anos. Em maio de 2018, começou a plantar árvores e arbustos no canteiro da avenida Eliseu de Almeida. Ciclista, espera que um dia a ciclovia que passa no local tenha algum sombreado que amenize o calor de quem por ela circula para ir ao trabalho ou passear. Ele pedala por ali todos os dias.

Lichia, maracujá, café, goiaba, pitanga e amora são algumas das frutas que podem vir a crescer na área plantada por Cabral.

"Sempre que estou plantando para alguém para conversar. As pessoas querem ver alguém colocando a mão na massa e fazendo alguma mudança. Exemplo inspira", conta Cabral, que compareceu à sua plantação também nos dias 23 e 24 pela manhã. "Estou aproveitando o feriado", disse.

"Penso que o espaço é grande e que as pessoas poderiam se alimentar dessas frutas na rua", afirma. "Faço isso porque, como sou professor, acredito no poder do exemplo e na  transformação que cada um pode fazer."  

As árvores urbanas têm importante papel. Diminuem a temperatura da cidade, absorvem os ruídos, capturam gás carbônico e aumentam a umidade do ar. Dão mais qualidade de vida para os pedestres e ciclistas.

A arborização voluntária dessa área da avenida Eliseu de Almeida começou logo que o primeiro trecho da ciclovia foi inaugurado, em 2014. Moradores passaram a plantar árvores espontaneamente no canteiro central.

Em 2015, uma mobilização de moradores da região conseguiu obter da subprefeitura do Butantã um projeto de arborização. Um plantio de mais de 100 mudas foi realizado em setembro daquele ano, com a participação do projeto Verdejando, da Rede Globo.

Naquela época, foram plantados ipês, grumixamas, quaresmeiras, jenipapo e araçá, entre outras espécies. Muitas dessas plantas vingaram e sobrevivem até hoje.

PLANTIOS COLETIVOS

O projeto Verdejando começou em 2013, com um plano de arborização e sensibilização de moradores de bairros mais desprovidos de verde. Promovido há seis anos, se expandiu em 2018 para Brasília, Minas e Recife. Em São Paulo, o programa contabiliza o plantio de 4.500 mudas.

Foi também em 2013 que o botânico Ricardo Cardim começou a plantar espécies da Mata Atlântica em jardins de empresas em São Paulo. Em 2016, levou a ideia às áreas públicas e aconteceu o primeiro plantio coletivo de uma Floresta de Bolso, no Itaim, sistema criado por ele.

As Florestas de Bolso procuram reintroduzir em espaços diminutos sistemas biológicos semelhantes aos das florestas. Usam espécies nativas e numa quantidade adequada a cada local, com combinação das plantas e uma estudada densidade de ocupação do solo. Nelas são observados princípios da sucessão florestal: primeiro espécies de crescimento mais rápido, que geram sombra, na vizinhança das que crescem mais lentamente, para provocar interações que favoreçam o desenvolvimento de todas.

De 2016 para cá, Cardim já levou sua ideia a vários parques e praças. Já plantou também dois jardins de chuva na cidade. Em dezembro último, receberam Florestas de Bolso uma área na beira do rio Pinheiros e uma outra nas margens da represa Guarapiranga.

Hoje há ao menos cinco grupos organizados de plantadores de árvores atuando em São Paulo. Além dos mutirões para criação de Florestas de Bolso, existem o Muda Mooca, Muda Ipiranga, Muda Leopoldina e Plantio dos Voluntários. Em São José do Rio Preto atua o Muda que a Cidade Muda.

Alguns deles fazem plantios simultâneos, chamados de Plantios Gerais, que servem para divulgar resultados de plantios e incentivar mais pessoas a participarem.

Que em 2019 mais iniciativas de plantio urbano apareçam. Feliz Ano Novo!

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