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Lei que libera poda de árvores em SP privatiza bem público

Na mesma semana em que proíbe descartáveis, prefeito coloca em risco a saúde da cidade

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Árvores em rua de São Paulo - Martha Salomão/Folhapress

O prefeito Bruno Covas (PSDB) sancionou na manhã de segunda (13) lei que proíbe bares, restaurantes, hotéis e comércios da cidade de São Paulo de fornecerem aos clientes copos, facas, garfos, pratos e mexedores de bebida plásticos descartáveis.

Esses produtos devem ser substituídos por similares de material biodegradável, compostável ou reutilizável. Os locais terão até janeiro de 2021 para se adequar.

Foi uma ótima notícia para a cidade. A quantidade de descartáveis produzidos, usados por minutos e dispensados é monstruosa. A proibição segue tendência mundial e complementa o veto aos canudinhos, que foi decidido em meados de 2019, também com lei de autoria do vereador Xexéu Tripoli (PV).

Dois dias depois, dia 15, Covas sancionou uma lei que libera a poda das árvores na cidade. A lei permite que os moradores contratem empresas para o corte de árvores.

Segundo a antiga norma, de uma lei de 1987, a poda só podia ser realizada pela subprefeitura da região. Em espaços públicos, apenas servidores da prefeitura ou empresas contratadas pelo município poderiam fazer esse serviço.

Agora, o trabalho em áreas privadas pode ser orientado por engenheiros agrônomos, florestais ou biólogos.

No caso da poda em espaços públicos, antes, a prefeitura precisava ter com antecedência um laudo emitido por técnico autorizando a poda.

Com a nova lei, os técnicos contratados terão autonomia para autorizar o serviço no local. Terão de emitir um laudo declaratório para a subprefeitura da região. 

Quem vai conferir se o laudo estava certo? De que forma? Quando? E se não estiver? Quem repõe a árvore? E os benefícios que ela trazia? Imagine isso em escala.

A prefeitura diz que recebe cerca de 50 mil chamados por ano – 200 pedidos ao dia – pelo 156, para podas e remoção de árvores.

Há uma encrenca real na questão das árvores urbanas em São Paulo.  A calçada é considerada área de responsabilidade do proprietário do imóvel, porém as árvores são públicas. Apesar de serem um bem público, não se faz manejo adequado, não há plano de plantio e nem programação eficiente de podas para manutenção.

É um problema sim, mas a solução não poderia ser a que vem embutida na lei, que significa lavar as mãos e privatizar um bem público.

Há um enorme risco de haver podas inadequadas e desnecessárias. As árvores são responsáveis pela manutenção do clima, pelo sequestro de carbono e pelo combate à poluição. Diminuir a cobertura vegetal da cidade pode alterar drasticamente a qualidade do ar e o regime de chuvas. É a saúde pública que está em jogo.

“Além de a prefeitura não conseguir fazer o manejo adequado, a companhia de energia faz podas drásticas, sem o cuidado técnico necessário, visando apenas preservar a fiação e colocando em risco a vida das árvores”, observa a professora Thais Mauad, da Faculdade de Medicina da USP.

“A atitude da prefeitura com essa lei é de deixar as pessoas individualmente decidirem sobre bens públicos. É pegar um bem público e entregar para decisões privadas”, diz a professora.

“Já temos uma arborização precária, com árvores velhas, sem plano de plantio, sem levantamento de quantidade e tipos de árvores plantadas. Vamos perder mais árvores. É um absurdo”, completa.

“É sabido que a quantidade de árvores tem influência direta em várias áreas da saúde pública”, observa Thais.

A professora orienta um estudo sobre a relação entre melhor arborização e diminuição de hipertensão na população. O trabalho de pós doutorado de Tiana Moreira  (“Green spaces, land cover, street trees and hypertension in the megacity of São Paulo”), revelou que quanto mais árvores de rua e proximidade de parques há na região de moradia menor a chance de diagnóstico de hipertensão.

“Árvore de rua é patrimônio público. Tem de ser cuidada como tal”, diz Thais.

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